UMA MENSAGEM MANUSCRITA É AMOR PARA A VIDA

Andresa Bastos
Andresa Castro de Bastos fundou recentemente a Love of My Life, uma marca cultural de greeting cards personalizados. A empresária já está a trabalhar nas primeiras coleções inspiradas em Portugal, Brasil e Angola. Os seus cartões distinguem-se pela autenticidade da sua criatividade.

De engenheira civil a fundadora de uma marca cultural de luxo. Como surge a mudança?

Somos seres de múltiplos talentos, e somos seres condicionados pela vida também. Cedo percebi ter curiosidade pela natureza e experiência humana e ter sensibilidade criativa. Mas optei pela engenharia! Hoje, penso que devia ter tido a coragem de seguir a minha natural propensão para as artes e ciências humanas, que foi estimulada pelo contacto com cinco países onde vivi localizados no continente africano, americano e europeu. No entanto, a engenharia aplicada é também uma excelente ferramenta na vida.  Traz-nos disciplina, método e resiliência, e nesse contexto,aprendi muito. Os greeting cards são uma paixão de vida. A marca Love of My Life estava desde que me conheço, condenada a nascer. Adoro a “coisa manuscrita”, sempre escrevi, recebi cartas e greeting cards – e é sempre uma emoção receber e enviar correspondência em qualquer cenário da vida. Cartas e greeting cards são como as fotografias, guardam momentos, têm associado a si um universo de sentimentos e de vivências. Estou a fazer uma tese de mestrado na Católica do Porto sobre greeting cards, é um mundo que se expande. É maravilhoso. A independência, que vem de liderar um projeto de negócio, é um objetivo pessoal.

O que podemos esperar da sua marca?

A raiz desta marca é a cultura, a nossa caminhada humana, é uma homenagem às nossas mãos e ao mesmo tempo aos sinais e símbolos culturais que nos rodeiam. As coleções são limitadas. São coleções associadas a países distintos, e o elemento decorativo é fisicamente presente no greeting card, em uma das faces. É assim um apelo aos sentidos. O lado virgem do cartão tem o propósito de propor a escrita à mão: sinal intransmissível da pessoa que oferece o greeting card. Cada coleção é uma homenagem declarada a algo de precioso, mas que nos é familiar, que nos acompanha no dia a dia, e que na boa parte das vezes, está connosco há séculos ou há milénios. É uma  marca profundamente humana e é também nesse contexto que o luxo partilha essa natureza, o luxo da história e das relações humanas. A Love of My Life materializa um gesto nobre e generoso num objeto-prenda original, elegante, belo e único. Nesta fase estou a trabalhar nas primeiras coleções de Portugal, Brasil e Angola, por serem os países da minha vida e que muito me inspiram. Seguir-se-ão outros continentes, como a Ásia (Japão e China). Os materiais são originais e autênticos. A sua fonte é sempre o indivíduo, a organização ou entidade que protege esse bem ou essa arte. Em Portugal, tem-se vindo a perder o hábito de trocar mensagens manuscritas e a Love of My Life vai desafiar esse status quo que sobrevive do básico ainda que merecido “parabéns” ou “obrigado”. Os greeting cards são em si mesmos uma marca física e intemporal, que ao contrário das mensagens digitais nos nossos telemóveis e social media, estes podemos guardar e contemplar para sempre, podemos e devemos ser donos da nossa história. E estas pequenas grandes homenagens relembram uma história humana comum que cada vez mais nos deve sensibilizar e confortar.

Como é que o coaching entra na sua vida profissional?

Quando concluí o MBA Atlântico em 2016, que decorreu em Luanda, Rio de Janeiro e Porto, estava à procura de uma nova oportunidade profissional. Surgiu um projeto de capacitação e coaching de jovens empreendedores em Angola, província de Cabinda, que aceitei. Assim, trabalhei para uma academia Sul Africana brilhante que estava a conduzir este projeto. Este projeto foi um privilégio e um desafio, numa cidade com sérias dificuldades económicas e onde o acesso à informação de qualidade é escasso. Cresci muito com os empreendedores com quem trabalhei, e hoje a palavra resignação tem para  mim um significado alargado, que toca a sabedoria, a capacidade de aceitar “a falta de” mantendo a dignidade daquilo em que se acredita, é uma pedra preciosa que guardo comigo. Ao mesmo tempo usufruí de passeios inspiradores, em que Angola é fértil e que incluíram a fabulosa floresta do Maiombe.

Trabalha com o mercado português e sul africano. Quais as maiores diferenças?

Na África do Sul estive em formação de preparação para o projeto de Angola. Nesse contexto, percebi que a juventude sul africana tem um enorme talento para o fazer business. Com o fim do apartheid em 1998, o sistema político criou uma moldura legal de maior inclusão dos jovens negros para iniciarem ou participarem de projetos empresariais. Esse contexto estratégico permitiu que hoje exista uma cultura empreendedora e dinâmica, mas também mais justa e diversificada, que é reconhecida internacionalmente.

Qual a maior dificuldade que sente, enquanto mulher empresária?

Estou a iniciar o meu projeto, e creio que esta é a fase mais difícil, onde o tipo de identidade e de estrutura que se constrói terá impacto no futuro da marca. Costumo dizer que sou lenta, porque entendo que a originalidade dá trabalho, precisa de tempo para se arredondar e fazer sentido para o propósito da marca. O abstrato é fundamental nesta fase, e ter a paciência de amadurecer esse conceito sem pressa, é difícil, mas absolutamente necessário. Hoje a Love of My Life é uma depuração, construída com generosidade propositada. É sem dúvida excitante a construção do projeto e a aprendizagem intensa. O meu contexto familiar nunca foi empresarial e é um desafio também, lidar com o mind set empreendedor, que pela sua vocação de conquista constante, requer tenacidade, já que as frustrações, negociações e compromissos são “o” processo. A gestão do tempo e dos recursos económicos é um exercício exigente. Mas sobretudo, estou sempre a aprender, tento estar aberta e atenta a coisas diferentes, porque são essas que trazem as maiores e melhores surpresas. Estarei sempre perto de fontes de conhecimento e a Love of My Life só faz sentido assim. Sou obrigada a reconhecer a soft nature deste projeto, mas essa soft nature é justamente a sua razão
de ser: a emoção, o tempo, o amor manifesto. Creio que as artes, o artefacto, e as indústrias criativas fazem ainda um caminho de afirmação, que é cultural.