Rita Gonçalves Moreira, licenciada em Gestão pela Universidade Católica do Porto, é vogal executiva do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário do Porto, cargo que lhe coloca desafios diariamente e acrescenta o sonho de fazer cada vez mais e melhor para o futuro da Saúde no país.
Rita Moreira, 41 anos, exerce a função de Vogal Executiva do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário do Porto desde finais de janeiro de 2019, sob proposta do Ministro das Finanças e da Ministra da Saúde. O convite até pode ter sido surpreendente – a executiva era Vice-Presidente da Administração Regional de Saúde do Norte e operava sobretudo na área financeira. Mas foi irresistível. O regresso ao Centro Hospitalar do Porto, onde já tinha estado em 2012, não a assustou, pelo contrário: “Para um gestor, qualquer novo desafio ou nova área de gestão, é algo fascinante. Todos sabemos que se trata de um desafio. E quem não gosta de desafios?.” Não será com certeza a gestora que, inspirada pelo pai, economista, “e sempre trabalhou imenso para obter sucesso”, optou antes por cursar Gestão em detrimento da previsível Economia. A ideia seria “absorver o melhor dos dois mundos: a gestão aplicada à vida e a possibilidade de podermos escolher múltiplas indústrias como a banca, as finanças, a saúde, a consultoria de gestão e o marketing”, revela. E assim tem sido o seu percurso profissional – multifacetado e aberto a novas valências e experiências. Começou por prestar consultadoria na Deloitte, em 2004. “Foi aí que contactei pela primeira vez com a área da saúde”, diz, “quando nos pediram que colaborássemos na concretização do atual Centro Hospitalar Universitário de Coimbra em Empresa Público Privada (EPE) – um trabalho muito exaustivo mas apaixonante.”
Em 2011, quando chefiava o Departamento de Planeamento de Gestão da Prio Foods, surgiu a oportunidade de fazer uma reformulação na área financeira da Administração Regional de Saúde do Norte, ao nível do planeamento e report de informação. Aceitou a proposta e percebeu que esse era um admirável mundo com muito ainda por fazer e melhorar. O regresso em 2016, como Vice-Presidente desta grande organização foi, até hoje o seu maior desafio profissional. “Foi algo que não estava mesmo nos meus planos nem ambições, mas talvez pela surpresa, tenha sido dos desafios mais gratificantes da minha carreira”, admite. Afinal a Administração Regional da Saúde Norte além de fazer a ponte com o setor social e convencional e o Estado, serve uma população de 3,5 milhões de pessoas! Apesar de se sentir abençoada pela experiência, contactou com uma realidade que, nem em tudo, foi cor-de-rosa. “A função pública, na saúde, que é o departamento no qual me movimento, tem, infelizmente, poucos quadros diferenciados, o que não permite aos gestores de topo tempo para o pensamento estratégico”, explica. “Refiro-me a áreas não clínicas, como Planeamento de Gestão, Serviços Financeiros, Serviço de Aprovisionamento, Serviço de Logística… Logo, mesmo com pessoas muito competentes, dada a falta de técnicos superiores, acaba por sobrar muito trabalho administrativo. Falta também uma maior autonomia para os Conselhos de Administração”, aponta Rita Moreira, que vê aqui uma grande diferença na gestão pública versus gestão privada. Mas, não sendo mulher de baixar os braços, percebeu que com tanto que ainda havia para fazer, teria que trabalhar nesse sentido e fazer os milagres apenas possíveis àqueles que acreditam na magia do empenho. Embrenhou-se cada vez mais no complexo mundo dos centros hospitalares, “para ir mais longe”. Aprofundou conhecimentos nos domínios das compras e logística, farmácia hospitalar e, neste momento, tenta também uma abordagem mais direta com as áreas clínicas.
O CENTRO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO DO PORTO E A PANDEMIA
Se o pai de Rita parece ter inspirado a gestora com a sua notável capacidade de trabalho, estratégia e dedicação, da mãe com certeza herdou, segundo a própria, uma energia (quase) inesgotável… A título de exemplo: quando iniciou funções no Centro Hospitalar Universitário do Porto (que agrega o Hospital Geral de Santo António e a Maternidade Júlio Dinis) assumiu os pelouros com os quais se sente muito à vontade, como os Financeiros, a Faturação, o Serviço de Informação à Gestão, e o Serviço e Sistemas de Informação. Em abril de 2020, em plena pandemia, acumulou, ainda, a ges- tão da Unidade de Alimentação e o Departamento de Aprovisionamento e Logística – o maior do hospital. Qual é o segredo do seu sucesso? Quase acreditamos ser simples quando responde: “Procuro seguir uma liderança de proximidade e estar rodeada por uma boa equipa”. Ainda assim, no pico da pandemia devido ao COVID-19, alguns dias foram particularmente difíceis de ultrapassar. “Costumo dizer que há uma Rita antes e depois da pandemia”, conta. “O embate foi muito violento; enquanto todos se fechavam em casa, nós tínhamos de estar cá fora para dar a melhor resposta. E conseguimos”, afirma, vitoriosa. “Saí muitos dias a chorar, sem saber o que nos ia acontecer. Mas era um choro rápido. De cinco minutos. Não podia ser mais, porque tudo tinha que avançar.”
Foram tempos intensos nos quais que mal sobrava tempo para respirar. Os números conferem: o Centro Hospitalar do Porto contabilizou cerca de 1.987 doentes internados e outros 463 em cuidados intensivos. A capacidade instalada para estes últimos foi larga- mente expandida e, na segunda e terceira vagas continuou com a produção cirúrgica, enquanto manteve as consultas por meios digitais e móveis. Os resultados, segundo Rita Moreira, deveram-se sobretudo à associação entre todos os profissionais. “Deu-se um sentimento de união tão forte, que foi possível recriar espaços, tratar o desconhecido, prever stocks (muitas vezes inexistentes às sextas-feiras e que não nos deixavam dormir porque não podiam faltar), tratar o desconhecido… ”. Afinal, é nos momentos de crise que os vencedores mostram a fibra da qual são feitos.
MULHER, MÃE E GESTORA NUM MUNDO DE HOMENS
A competência não é sinónimo de vida tranquila. Especialmente quando se vive uma pandemia e se é peça chave na sua resolução. “Quando tudo encerrou, o meu marido levou o escritório para casa”, lembra. Deixou de poder contar com a ajuda dos pais e da empregada doméstica. Inicialmente não se assustou. “Como mãe e mulher, conciliar tudo é já norma”.
Mas, desta vez, não era o mesmo. Tratava-se de trabalhar quase 24 horas por dia. “Lembro-me de sair de manhã com o almoço pronto para o meu marido e a minha filha, e os dois lanches para ela – assim não ficava preocupada.” À noite via os trabalhos da sua menina, indicados pelas professoras, preparava os mate- riais para o dia seguinte e rezava para que ela ficasse bem. O que nem sempre foi fácil. “Sentia-me sempre a falhar como mãe. Não poder estar presente, quando tudo para ela também era novidade”, recorda. As suas rotinas também sofreram alterações: “Quando regressava, tarde, tinha a casa revirada. Apetecia-me ralhar, discutir… mas era preciso perceber que naquele es- paço houve tempo para estudar, brincar e descansar o dia todo!”. Entretanto, seguiu a lei dos mais fortes – foi-se adaptando. O cansaço passou a fazer parte do quotidiano, tal como o estigma de ser mulher bem-sucedida, sobretudo sendo jovem num cargo normalmente exercido por homens mais velhos. O que nunca a impediu de prosperar e muito menos de sonhar: “Quero ver a minha família crescer e o melhor para o meu centro hospitalar!“