Comunicação Humanizada na Era Digital: A Voz de Luciana de Carvalho Viana

Luciana Viana, diretora de relações internacionais para a lusofonia
A paixão pela comunicação sempre esteve presente na vida de Luciana de Carvalho Viana, mas foi a escuta ativa e a busca pela conexão genuína que a levaram a transformar a comunicação humanizada em missão. Nesta entrevista para a Revista Liderança no Feminino, Luciana reflete sobre a importância da empatia no mundo digital, os desafios de promover uma cultura inclusiva e como líderes podem incorporar uma comunicação mais autêntica nas suas organizações.

Como é que nasceu a sua paixão pela comunicação? E como é que a comunicação
humanizada entrou na sua vida?

Comecei a trabalhar com 16 anos (lá se vão algumas décadas) porque queria ter independência financeira e comecei a trabalhar com o público — já vi todo tipo de gente. Gosto de lidar com pessoas, aprendo diariamente com isso, nem que seja como eu não quero ser. O mundo corporativo, em sua maioria, tem tanto ego e vaidade, que as pessoas perdem o olhar humanizado pela equipe que está lá do lado fazendo acontecer. As pessoas precisam ser valorizadas e respeitadas pelo que fazem, e não apenas pelos cargos que ocupam. A minha paixão pela comunicação nasceu da escuta: entender o outro, adaptar a linguagem, e dar espaço para as emoções sem desorganizar a mensagem. Sempre acreditei que comunicação é conexão — e por isso, deve ser coerente, simples e honesta. A comunicação humanizada, para mim, é a ponte entre o que se quer dizer e o que realmente é compreendido. A minha missão hoje é ajudar outras pessoas a construírem essa ponte com mais empatia, e menos julgamento.

Em que medida considera que a transformação digital e a comunicação empática
podem caminhar juntas?

Elas não só podem como precisam caminhar juntas. A tecnologia nos aproxima geograficamente, mas se não houver sensibilidade, o digital pode nos afastar emocionalmente. Vivemos em um tempo em que é possível trabalhar, aprender, liderar e influenciar à distância — mas isso não anula a necessidade de sermos humanos nas
nossas trocas. É preciso desmistificar o medo de que o digital tira empregos ou elimina relações. Pelo contrário: ele nos desafia a aprender, a incluir mais pessoas e a garantir que a literacia digital seja compreendida como um direito. A comunicação empática nesse contexto é um antídoto à desumanização dos processos — é o que torna o digital sustentável.

Quais são os maiores desafios em promover uma cultura digital que seja também
inclusiva e emocionalmente consciente?

O maior desafio é percebermos que tecnologia não é só ferramenta, é também comportamento. Promover uma cultura digital inclusiva exige ouvir quem está à margem, entender o que impede certas pessoas de acessarem o digital e desenhar soluções com
base nessa escuta. Outro desafio é conseguir equilibrar os dados com as emoções. Precisamos entender as métricas, sim, mas sem perder a sensibilidade e as necessidades locais. Levar esse olhar direcionado e humanizado para as estratégias digitais é urgente.

Tem desenvolvido um projeto de comunicação humanizada com grande impacto.
Quais são os próximos passos?

Gostaria muito neste ano de levar a aula de Comunicação Humanizada, que hoje ministro online, para o formato presencial. Falar sobre isso “olho no olho” é transformador. Essa troca, esse feeling de como as pessoas percebem e absorvem o conteúdo muda completamente a narrativa — tanto para os que ouvem quanto para a minha fala. Penso em levar esse projeto para eventos e empresas aqui em Portugal, com uma abordagem prática, sensível e contemporânea. Inclusive, quero dividir esse espaço com uma amiga que atua com o tema da “Felicidade nas organizações”. Acredito serem dois temas fundamentais e que por isso, faz todo o sentido serem partilhados juntos. No mundo de hoje, precisamos cuidar da “nossa gente” — esse é, ou deveria ser, o maior ativo de qualquer empresa e da sociedade.

A Lusofonia é um campo fértil para a inovação digital. Como é que vê o potencial
da transformação digital nesse ecossistema?

Vejo com entusiasmo e com senso de responsabilidade. A Lusofonia é diversa, rica em culturas e desafios, e isso por si só já exige que qualquer inovação digital seja pensada com muito cuidado. Temos países com níveis diferentes de acesso, com realidades distintas de investimento em tecnologia, e ainda assim, com potencial de se transformarem em pólos de inovação. Por isso, acredito que a transformação digital na Lusofonia deve acontecer com inclusão, com escuta ativa e com soluções adaptadas a cada contexto. Teremos, por exemplo, uma nova edição do evento “Nações Inteligentes” (evento organizado pelo MUDA – Movimento pela Utilização Digital Ativa) aqui em Lisboa, que será focado em Inteligência Artificial aplicada à saúde. Esse é um tema que me move — não só como profissional, mas como mãe de um jovem estudante de medicina. Quero que o meu filho, Gabriel, cresça num mundo em que o digital é usado para potencializar a vida, sem afastar o lado humano da medicina.

Acredita que o propósito das marcas e das organizações está hoje mais vinculado
à forma como comunicam?

Sim. E mais do que isso: o propósito só é real se for percebido como verdadeiro. O consumidor, o colaborador e até os investidores estão atentos. Eles não compram só um produto — compram a sensação de pertencimento. A identificação com o discurso e com a conduta é o que garante fidelidade. Eu costumo dizer que as empresas não têm mais como esconder seus bastidores. As pessoas acompanham, comentam, expõem. Se o discurso de fora não condiz com a prática interna, a crise é só uma questão de tempo. As marcas mais fortes não são as que gritam, são as que escutam.

Como é que as lideranças podem (e devem) incorporar uma comunicação mais
consciente e autêntica?

As lideranças são exemplo — sempre. O tom emocional de uma empresa é definido, muitas vezes, pela forma como os líderes se comunicam. Uma liderança que escuta, acolhe e comunica com presença transforma o ambiente de trabalho. É preciso ensinar, reforçar e valorizar a comunicação empática como ferramenta de gestão. Isso inclui a importância da literacia digital, da escuta ativa, da diversidade nas vozes e da inclusão sem exclusão geracional. Essa comunicação mais consciente deve ser tratada como extensão da cultura organizacional — mas não só isso. Precisa estar no ADN da empresa, e não apenas no quadro de “valores e missão” pendurado na sala do CEO.

Que conselho daria a outras mulheres que desejam construir uma trajetória de
impacto com mais propósito, sem abrir mão da sua essência?

Meu conselho é: não se distraia tentando se encaixar. E não terceirize seu valor. A trajetória com impacto começa com a verdade — com a aceitação da sua história, com a reconexão com o seu “porquê” e com coragem de mostrar vulnerabilidade. Nem sempre será fácil. Às vezes, vão te julgar por ser emocional. Outras vezes, vão dizer que você é racional demais. Mas quando você se reconhece e se respeita, esses ruídos não te silenciam. Eles te fortalecem. “No fim do dia”, como dizem os portugueses, sinto que estou nesta missão para levar um pouco desse olhar e transformar o vínculo entre o digital e as pessoas, tornando-o mais real e não menos emotivo. Isso é o que me dá brilho nos olhos.