COMO MARIA DE LANCASTRE VALENTE CHEGOU A DIRETORA NA SRS LEGAL

Maria de Lancastre Valente, Diretora de Pessoas e Cultura na SRS Legal
Interessada pela advocacia, Maria de Lancastre Valente juntou-se à sociedade de advogados SRS Legal, onde se tornou sócia. Porém, houve uma “viragem” ao ser promovida para Diretora de Pessoas e Cultura, passando a focar-se na “gestão interna”.

Com mais de 20 anos de experiência na área da advocacia, Maria de Lancastre Valente passou uma grande parte deste período como sócia da sociedade de advogados portuguesa SRS Legal. Contudo, neste ano, houve uma “viragem” na sua carreira, subindo para o cargo de Diretora de Pessoas e Cultura na mesma empresa, que detém atualmente.

Com uma infância e adolescência passadas fora de Portugal, Maria sempre teve interesse pela advocacia. Depois de ter frequentado apenas dois anos do curso de Língua Portuguesa e Línguas Estrangeiras Aplicadas, na Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa, a sócia decidiu tirar a licenciatura em Direito, no mesmo estabelecimento universitário, entre 1996 e 2001.

De acordo com Maria, esta mudança de curso proveio da conclusão que tirou de que “as línguas seriam, sobretudo para [si], uma ‘muleta’, ainda que determinante no [seu] percurso, em vez de uma preparação para a profissão” de advogada. Apesar de ter ponderado “vagamente” seguir Comunicação Social, a um certo ponto, acabou por considerar Direito a “opção mais segura, até pelo ‘legado’ familiar”. Para além disso, entre 2006 e 2007, Maria especializar-se-ia ainda mais na área, ao fazer uma Pós-Graduação em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, como é referido no LinkedIn da sócia.

Assim que terminou a licenciatura em Direito, em 2001, a advogada começou a enviar currículos para os “principais escritórios a pedir estágio”, o que considera ser “o passo natural subsequente” da conclusão do curso. Dos vários grupos que contactou, a sociedade SRS Legal acabaria por se tornar no palco para o início do seu percurso profissional. Criada em 1992, com a denominação original Grupo Legal Português, a SRS Legal consiste numa sociedade de advogados portuguesa que tem como principal função prestar “assessoria full-service a clientes nacionais e internacionais em todas as áreas de negócio”, de acordo com o seu website.

O grupo nasceu da associação entre as empresas Simmons&Simmons, J&A Garrigues e Pinheiro Neto, o que deu origem ao “primeiro escritório internacional em Portugal”, e, inicialmente, a totalidade dos seus membros pertenciam ao Club dos Abogados, que estava presente “nos principais países europeus e da América Latina”, como é referido no website da SRS Legal. O grupo foi considerado uma “das primeiras sociedades de advogados nacionais, senão mesmo a primeira”, a “institucionalizar-se e criar áreas de prática especializadas, há mais de 30 anos”, afirma Maria. Segundo a sócia, esta abordagem foi “inovadora” na altura, pois as sociedades “assentavam numa lógica de projeção e serviço individual e individualizado ao cliente”.

Atualmente, a equipa do grupo nacional é composta por “uma centena de advogados, de diversas Áreas de Prática” com o objetivo de “responder às necessidades dos clientes, com agilidade, empatia e inovação”, segundo o seu website. E isto está bem patente na assinatura da empresa – “About Law. Around People.” –, que Maria afirma “resumir bem” o trabalho desta, em que “aliam a dimensão da excelência técnica […] à dimensão da excelência relacional”, algo que é “muito valioso” e “distintivo” da sociedade. A trabalhar há 22 anos na SRS Legal, Maria considera este grupo a sua “casa profissional”, tendo começado aí como estagiária até se tornar sócia:

“Foi aqui que ‘nasci’, me formei, me desenvolvi e progredi, num percurso consistente que muitos outros, felizmente, também fizeram e continuarão a fazer, de advogada-estagiária a sócia, no meu caso, sempre no Departamento de Direito do Trabalho”.

Depois de vários anos a “gerir clientes”, a carreira de Maria sofreu uma “viragem” no início de 2023, ao ser promovida para Diretora de Pessoas e Cultura, passando a focar se “exclusivamente na gestão interna das Pessoas e Cultura da SRS Legal”. Para a sócia, apesar de ter sido uma evolução “natural”, que “exigiu um voto de confiança” da empresa, esta foi “’a’ mudança”, referindo que passou “vários anos a pensar nela”, havendo “muita autorreflexão e investimento pessoal no [seu] autoconhecimento e também formação direcionada para algumas competências específicas”, nas quais “continua a apostar” atualmente.

Durante este período de autoanálise, a diretora inferiu que “queria experimentar outras coisas, já numa fase de maturidade profissional”, em que se “sentia confortável, mas inquieta”. Este sentimento foi impulsionado pelo seu “percurso familiar e pessoal numa fase formativa muito importante, que ‘cunhou’ grande parte do [seu] ADN” e, especialmente, pelo interesse que foi obtendo “pelos temas da gestão e liderança, sobretudo de pessoas”. Igualmente, Maria compreendeu que “a mudança é possível, é positiva e tem valor”, independentemente da altura no percurso profissional em que é feita: “Fazer mudanças tardias na carreira tem tanto de vertiginoso como de empoderador – neste momento, gerir pessoas é o que gosto de fazer”.

Atualmente a atividade de Maria foca-se exclusivamente na “gestão profissional das pessoas”, tendo como único cliente, interno, as pessoas da SRS Legal. Na sua ótica, faz “o mesmo que faz uma diretora de Pessoas de uma empresa”, mas “num contexto ligeiramente diferente”, visto que “as sociedades de advogados não são sociedades comerciais”, impactando “a estrutura e prática governativa interna”. Dentro de uma “equipa de gestão” e “não [de] uma área de prática/negócio”, a diretora dedica-se “100% à gestão” e tem como “missão” a aproximação das “pessoas do negócio” e do “negócio, e [a] sua operacionalização, das pessoas”. De acordo com Maria, este processo “começa na estratégia, declina para a operação” e, por fim “entronca na cultura e na comunicação interna”. Maria explica que “a cultura organizacional suporta, alimenta e norteia todas as etapas da jornada do colaborador”, baseando-se numa “pergunta fundamental: quem somos e o que queremos ser (e também quem não somos e o que não queremos ser)?”, enquanto que a comunicação interna corresponde ao “canal” e, por isso, ao “saber comunicar, com eficácia e de forma consistente”, que considera ser “o primeiro passo para assegurar uma convergência entre o que observamos, o que dizemos e o que fazemos”.

De maneira a concretizar estes aspetos, a diretora conta com o “apoio” da sua equipa de gestão “dedicada e competente”, trabalhando, igualmente, “em articulação com as outras áreas de gestão” da SRS Legal, tais como a de Marketing, a Financeira, a de Logística e Segurança, entre outros departamentos, sempre “sob a batuta da Direção-Geral, dos Managing Partners e do Conselho de Administração”.

Assim, para Maria, o cargo de Diretora de Pessoas e Cultura (e a colaboração entre os diferentes departamentos) impulsiona “sinergias”, que são “muito virtuosas”, sendo “uma espécie de fecho de círculo”: “Descer às fundações para redescobrir quem é a organização, a minha, a SRS Legal, como funciona na engrenagem, como queremos fazê-la crescer, fazer crescer as suas Pessoas, de forma profissionalizada e estratégica – captando, desenvolvendo e retendo as melhores, numa organização una, responsável, sustentável e ágil, e que se quer escancarada para o Mundo”.

Apesar de “prezar a estrutura e a estabilidade em geral” e de necessitar “de ‘norte’ e rotinas”, Maria admite gostar de “criar” e uma conversa recente “sobre a [sua] função”, diz, fê-la despertar para a ideia de que, mesmo “não [tendo] nenhum talento particular daqueles que associamos tipicamente à criação” como “o desenho, ou a pintura”, a “criação tem muitas vestes”. Assim, entendeu que, no cargo de Diretora de Pessoas e Cultura, é “desafiada e [sente-se] estimulada na criação – seja de processos, seja de planos, seja de projeto, seja comunicando” –, revelando, igualmente, que aprecia “validar e materializar essa criação em equipa” e “ter autonomia para decidir […] com a liberdade que a função oferece e merece”. Para além disso, neste cargo, Maria consegue ter “a possibilidade de combinar um conhecimento profundo do setor e do negócio, com a [sua] experiência como advogada especialista em Direito do Trabalho e ‘casá-la’ com a gestão profissional de pessoas”.

Na ótica de Maria, a “beleza” da gestão de pessoas encontra-se no facto de ter “tanto de incerto e intangível, quanto de mensurável e concreto”, visto se focar em seres humanos, “com emoções, histórias e expectativas, num contexto económico e organizacional dinâmico e produtivo, gerador de serviço e de resultado”.  Para além disso, outras motivações passam pelo “desconforto do desconhecido, [pela] criação e supelizar essa criação em equipa” e “ter autonomia para decidir […] com a liberdade que a função oferece e merece”. Para além disso, neste cargo, Maria consegue ter “a possibilidade de combinar um conhecimento profundo do setor e do negócio, com a [sua] experiência como advogada especialista em Direito do Trabalho e ‘casá-la’ com a gestão profissional de pessoas”.

O “estímulo de estar a fazer uma coisa diferente” é algo que motiva Maria neste cargo, ao “observar e trabalhar uma organização e para uma organização com lentes diferentes, bifocais”, referindo que “ter essa visão e capacidade, e poder testá-las em contexto real”, é algo “imensamente desafiante”. Para além disso, outras motivações passam pelo “desconforto do desconhecido, [pela] criação e superação de uma tarefa nova, ainda que simples, [e pelo] contributo materializado num projeto complexo”, como o “caso da transição em curso do senior management da SRS Legal”, que a sócia revela estar a ser “uma experiência muito rica”.
Devido à sua imprescindibilidade, os escritórios e sociedades de advogados têm apostado mais em áreas de gestão profissional, algo que, na opinião de Maria, é “inevitável”. Isto deve-se ao facto de que “os clientes com quem trabalhamos e ambicionamos trabalhar” correspondem “eles próprios [a] barómetros e accounts das melhores práticas de gestão” e, para “entregarmos serviço com a qualidade que exigem”, é preciso acompanhá-los e, assim, “mostrar que também o fazemos, e que o fazemos bem”. Sendo os grupos de advocacia “organizações complexas”, em que os advogados “não estão predominantemente capacitados ou preparados para devotar do seu tempo a gerir em contextos de maior complexidade”, e inerentemente “um negócio de pessoas”, a gestão profissional surge como uma “questão de eficiência”, visto que “gerir bem requer expertise e requer tempo”.

Ainda assim, Maria defende que os advogados não devem deixar de “investir na linguagem da gestão para melhor compreender, precisamente, o cliente” e, especificamente “no caso dos advogados com maiores responsabilidades de governance interna, a sustentabilidade da sua própria sociedade”.

Esta linguagem e “know how” correspondem a aspetos “muito importantes” para os profissionais assegurarem que “fazem bem o seu trabalho para o cliente e para que essa sustentabilidade interna seja mantida e, desejavelmente melhorada”, segundo a sócia da SRS Legal.

Como profissional de gestão de pessoas, Maria revela que, para se ser exemplar nesta área, deve-se possuir “características comuns a qualquer líder”, tais como “visão de helicóptero, boas capacidades analítica e estratégica [e] boa capacidade de desenvolvimento de talento”. Para além disso, é preciso um gestor apresentar “agilidade e coragem na tomada da decisão” e na “ownership da mesma, adaptabilidade à mudança, orientação para a solução” e também “ambição para arriscar”. Contudo, Maria realça que o mais importante nesta área é mesmo ter “empatia, saber ligar o mundo interno da organização aos desafios externos do negócio” e, acima de tudo, “ser o guardião do ADN da organização”.

Maria admite não se rever “no modelo ‘comando e controlo’” muitas vezes associado à área da gestão profissional, expressando que “gosta de pensar que [se] situa dentro” da chamada “liderança de serviço”, pautada por um “perfil que corporize uma abordagem ao relacionamento interpessoal assente em “prestígio”, a qual, diz, “cultiva e gera respeito, [é] agregadora e integradora e fomenta boa comunicação interna”, ao invés de “uma visão mais redutora de autoridade”.

Já como profissional na advocacia, Maria acredita que um bom advogado deve possuir “uma combinação de boa capacidade técnica […], com uma forte orientação para o cliente, intuição interdisciplinar, boa capacidade relacional, inteligência emocional e forte capacidade de observação e comunicação”.

“Conhecer bem o cliente, o setor em que opera, quais os seus movimentos, quem é o [seu] interlocutor, como comunica internamente, a quem reporta, o que são as suas ‘dores’, a sua linguagem” é extremamente relevante, de acordo com Maria, pois o cliente “quer uma solução pragmática, que resulta do fino e exigente equilíbrio triangular entre a gestão de tempo, de custo e de risco”, culminando, assim, na “lógica de [uma] verdadeira parceria”, em vez de “um mero apoio ou estudo técnico, ou solução operativa reativa”. Desta forma, num “mundo global, veloz, volátil [e] multidisciplinar”, esta estratégia é “fundamental” dentro da advocacia, na opinião de Maria, devendo os advogados, “mesmo que especialistas”, ser “camaleónicos”.

Apesar de a advocacia ser “uma profissão exigente, de esforço”, mas “muito gratificante”, que “tanto homens [como] mulheres estão igualmente capacitados para exercer e nela progredir”, como defende Maria, o sexo feminino continua a enfrentar nesta área os “mesmos desafios dos outros setores em geral”. A disparidade entre os géneros, a qual considera ser a “questão de ‘um milhão de dólares’”, é encarada por Maria “com bastante cautela e seriedade”, visto “entroncar com muitas outras [questões], sensíveis, sobre dimensões estruturantes da nossa vida individual, cultural e social”. Contudo, a executiva realça que a advocacia “já desbravou muito caminho” nesta questão, indicando que algumas sociedades de advogados portuguesas são atualmente “encabeçadas por Managing Partners mulheres, que fizeram um percurso notável, e a quem foram dadas as condições para evoluir nesse sentido”.

Este fenómeno, refere, tem também sido notável noutros “órgãos executivos de governo societário”, como “os conselhos de administração”, nas “várias áreas de prática/de negócio, e também [nas] equipas de gestão”, que vão promovendo mulheres “para lugares de direção e de liderança”, em que contribuem “de forma matricial para a estratégia” das suas organizações. Segundo a sócia, a SRS Legal apresenta “vários bons exemplos” em cada um destes grupos: “Estamos a fazer bom caminho, de forma responsável, sem superficialidades ou sensacionalismos”.

Como mulher num cargo de topo, são vários os conselhos que Maria dá às jovens que estejam interessadas na advocacia (e em qualquer outra área), desde o fomento da curiosidade e o estudo do “setor, [das] suas idiossincrasias” e outros aspetos, até ao desenvolvimento das “competências relacionais, de comunicação” e mesmo a “aprendizagem de línguas estrangeiras, de ‘linguagens’ complementares”, algo especialmente importante para as advogadas, na opinião da sócia. Igualmente, a diretora defende que as mulheres devem “observar e fazer perguntas com humildade”, que considera serem “atos de inteligência”, pois sem estes “não se aprende”, assim como “não ‘mirrarem’ a [sua] juventude” na “concretização de ambições profissionais” e também “não descurarem a Família”, que diz ser “a matriz fundacional de tudo o resto”. Mas, acima de tudo, o mais importante em qualquer área profissional é ser uma mulher “audaz, mas paciente”: “A audácia exige sair fora da nossa zona de conforto e arriscar. Se o caminho for mais lento ou em zig zag, tudo bem; será o resultado de escolhas ou vivências igualmente importantes naquele momento, ainda que isso possa não ser logo evidente. Isso vale para todos os estádios da nossa vida profissional – é importante que nos afirmemos e arrisquemos, mas pelas razões certas”, reitera Maria.