DO CORTE À COSTURA DO ÊXITO

Joana Bourbon, Creative, Fashion Designer

Já foi diretora de departamentos, colaboradora da Zara Woman, diretora criativa de uma escola e até mesmo coordenadora do Atelier responsável por um dos blocos do Cortejo de São Bartolomeu da Foz do Douro. Com formação em design de moda, o percurso de Joana Bourbon assenta, acima de tudo, no amor pela arte que cria.

A criatividade leva-nos a muitos sítios. A alguns, conduz ao grande ecrã, às salas de teatro aos lugares onde a interpretação reina; a outros, a criatividade apresenta o mundo silencioso das palavras, que, quando escritas, têm uma voz firme. Mas a criatividade não levou Joana Bourbon a nenhum destes sítios. Manifestou-se sim através do fascínio pela área da moda.

Assim, Joana resolveu correr atrás do que fazia o seu coração bater mais rápido tendo-se formado em design de moda no antigo centro de formação Citex, atual Modatex. Trata-se de um lugar que impactou de forma considerável a profissional de excelência que hoje Joana Bourbon pode se orgulhar de dizer que é. Conta que os conhecimentos técnicos e criativos que aprendeu foram, mais tarde, “essenciais para poder liderar com conhecimento”. Para terminar o curso, realizou um estágio curricular de seis meses e, quando este findou, o sucesso foi tanto que recebeu uma proposta para ser assistente de coordenação e professora do respetivo curso.

Aí desafiou-se, aprimorando as suas competências. Despediu-se deste projeto quando foi convidada para assumir as funções de diretora do departamento de moda e design do CITEVE. Apesar da vocação multidisciplinar na oferta de serviços criativos à indústria têxtil, a profissional conta que “a prioridade era a investigação e divulgação de tendências de moda a apresentar na feira internacional, Première Vision, em Paris”, que era e continua a ser a maior feira têxtil do setor. Anos depois, e durante um largo período de tempo, a convite de diversas empresas, foi a responsável por criar e gerir departamentos vocacionados à criação de produtos para o grupo Inditex, maioritariamente a Zara Woman.

É então que a vida de todos é abalada pela pandemia – o setor da moda não foi exceção. Durante esta altura, a Escola de Moda do Porto necessitou de um maior suporte na coordenação do ensino técnico e criativo e, portanto, mais uma vez, o nome de Joana foi o escolhido para um cargo de elevada responsabilidade: a direção criativa da instituição. Ao longo desses meses, diz ter conseguido criar “procedimentos que viabilizassem os cursos sem prejuízo das aprendizagens, mesmo com o país literalmente parado”.

Mas desengane-se se acredita que os desafios param por aqui. Se há algo que torna o percurso de Joana Bourbon único, são as constantes sur- presas que a vida lhe reserva.
No ano de 2023, a União de freguesias de Aldoar, Foz do Douro e Nevogilde quis revitalizar o Cortejo de São Bartolomeu da Foz do Douro e, para tal, contratou Joana para a coordenação do Atelier que cria e executa o bloco da própria União no respetivo desfile. Face a um projeto que considera ser, “sem dúvida, muito especial”, quer pelas “características tradicionais, como pelo cariz coletivo que esta festa tão única tem”, a resposta à proposta só poderia ser afirmativa. Entregou-se inteiramente ao trabalho que tinha em mãos, que passava também por encontrar estratégias de apoio às coletividades da região. A designer de moda confessa que:

  “criar todo o vestuário e fazer o styling para 200 pessoas tão diversificadas, com um tema definido à partida e tudo feito em papel, (…) requer muita flexibilidade na gestão, quer da equipa, como na de todos os participantes”, até porque todos os conhecimentos técnicos e procedimentos criativos têm de ser adaptados ou reinventados.

Joana Bourbon já desempenhou várias funções e esteve em vários cargos. Confessa que todos foram um desafio, todos “tiveram novas aprendizagens”. Destaca as coleções criadas para a insígnia da Zara Woman, que acarretaram “um grau de dificuldade e responsabilidade muito grande”. Além disso, salienta a coordenação necessária para a realização do cortejo, pois com vestuário em papel, é necessário efetuar uma “reinvenção de procedimentos quanto à criação e coordenação de todo o processo”. Por último, mas certamente não menos impor- tante, Joana realça a complexidade do ensino, que “obriga a compreender em profundidade o que é essencial quanto aos saberes”, tendo em conta as idades, “para criar profissionais capazes” para atuar na indústria da moda.

Focando neste último ponto que acarretou obstáculos a serem derrubados, além de todas as técnicas e teorias que Joana Bourbon leciona, o seu plano de aulas também passa por transmitir alguns valores aos seus alunos. A responsabilidade é o pioneiro da lista, seja “para com o trabalho que estão a criar”, como para “com os outros e com o local que coabitam”. Na sua perspetiva, “a responsabilidade gera bons exemplos, trás boas práticas e faz de nós mais focados e produtivos”. No mesmo nível de importância, Joana Bourbon coloca “o amor que todo o processo criativo deve ter”, pois considera que seja este o grande gerador da criatividade. Por fim, pede sempre aos alunos que treinem várias perspectivas da mesma ideia, o chamado “pensamento fora da caixa”. Afirma que quando se conciliam estes três fatores é possível gerar “novas ideias, novos produtos e ser verdadeiramente inovadores”. Joana Bourbon defende que a ideia e a originalidade não são suficientes, é obrigatório saber concretizá-la num espaço de tempo útil, para que esta “exista num plano material”, e que traga uma nova solução para o problema apresentado.

Com uma bagagem de experiências tão diversificada, a vida levou Joana Bourbon a compreender que “é na diferença que conseguimos construir novos e melhores caminhos”. “Aprendemos que são as competências humanas que dão forma aos resultados. No caso específico da criação e inovação, aprendemos que saber lidar com as diferenças quanto às competências humanas é sem dúvida a grande geradora de novos e melhores produtos”, acrescenta.

Além de marcada por elevada criatividade, a jornada de Joana Bourbon é também pautada por uma capacidade exímia de liderança de vários projetos em simultâneo. Vem provando que é possível ser mulher e ter sucesso profissional, apresentando-se como um exemplo de vida para uma sociedade que ainda tem um longo caminho a percorrer no sentido de compreender o significado de igualdade de género. “A verdade é que ainda estamos muito longe do patamar necessário”, comenta Joana, acrescentando que “as responsabilidades na vida pessoal”, principalmente se existem filhos à mistura, estão “longe de ter o equilíbrio necessário”. A líder encara esta desigualdade como sendo “pouco produtiva”, tornando nos, enquanto sociedade, “competitivos, quando devíamos ser cooperativos”.

Para si, “ser mulher é assumir a liderança em todas as frentes: casa, trabalho, pessoal e profissional — as exigências são muito maiores e sem o mesmo retorno ou reconhecimento”.

A designer lança ainda uma reflexão: “se observarmos os países mais produtivos, os do Norte, estas questões já não se colocam nos mesmos termos”, levando a que nosso país acabe por tardar em alcançar “os tão falados índices de produtividade”.

Enquanto mulher num cargo de liderança, Joana Bourbon confidencia já ter visto a sua capacidade ser questionada. Refere mesmo que, até “quando não há essa intenção, o processo de pensamento e a reação estão lá”. Acredita tratar-se de um sistema educacional milenar, por vezes “inconsciente”, que tem evoluído com o decorrer dos anos, mas ainda não está no ponto que seria preferível.

Assim sendo, não são precisas muitas palavras para Joana Bourbon descrever como seria, do seu ponto de vista, uma líder “perfeita”. Crê que basta ser “simplesmente humana”, porque, no fundo, é isso que todos nós somos, independentemente do cargo que desempenhamos.