OS SISTEMAS ALIMENTARES E O CLIMA SÃO PARTE DA AGENDA DO PLANEAMENTO DAS CIDADES

Cecília Delgado, é urbanista e investigadora, pós-doutorada em Políticas Públicas Intersectoriais no âmbito do Ordenamento Territorial, Sistemas Alimentares e Desenvolvimento Local
Cecília Delgado, é urbanista e investigadora, pós-doutorada em Políticas Públicas Intersectoriais no âmbito do Ordenamento Territorial, Sistemas Alimentares e Desenvolvimento Local. Acredita nas causas sociais e no conhecimento académico como veículo para melhorar as comunidades. Foi este espírito de missão que a levou a: 1) cofundar em 2018 a plataforma nacional Alimentar Cidades Sustentáveis; 2) a coordenar em 2020 o E-book Alimentar Boas Práticas da Produção ao Consumo Sustentável, ou mais recentemente; 3) a traduzir para Português a Declaração de Glasgow para a Alimentação e Clima. Três dos projetos em que está envolvida e que serão apresentados aqui.

Ao longo dos anos tem trabalhado fundamentalmente como professora e investigadora: Universidade Lusíada do Porto (1999-2013); Laboratório Nacional de Engenharia Civil (2014 a 2017). Mas também como coordenadora de planeamento urbano, no Programa Polis em Vila Nova de Gaia (2000-2007), um projeto nacional com uma forte componente
ambiental e de reabilitação liderado pela Parque Expo 98. Atualmente é investigadora na NOVA.FCSH – Faculdade de Ciências Humanas e Sociais – Nova Universidade e afiliada do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais, na Universidade Nova de Lisboa. No âmbito da sua atividade profissional tem conhecido vários países onde recolhe informação primária sobre iniciativas relevantes de Agricultura Urbana e Sistemas Alimentares Urbanos, nomeadamente em: Lima (Peru); Belo Horizonte (Brasil); Singapura; Viena (Áustria); Paris (França); Berlim (Alemanha); Toronto e Vancouver (Canadá); Bangkok (Tailândia).

COLABORAÇÃO COM A QUERCUS
Colaborar como voluntária especialista da QUERCUS, tem sido segundo a própria, uma oportunidade ímpar para refletir sobre o impacto dos Sistemas Alimentares no ambiente e clima a nível nacional e internacional, com uma equipa inspiradora (de mulheres!). A participação em eventos nacionais e internacionais dinamizados pela Quercus, como o recente webinar “Em Busca da Cidade Verde” com a Green European Foundation, ou a representação junto de parceiros internacionais como a Pesticides Action Network Europeia, ou ainda a federação de organizações ambientalistas EEB – European Environmental Bureau, tem sido um espaço de aprendizagem mútua e de divulgação do conhecimento a uma comunidade alargada no contexto europeu.
A Quercus é um dos parceiros da plataforma nacional Alimentar Cidades Sustentáveis desde a sua fundação. Por exemplo, a candidatura ao apoio do Projeto Make Europe Sustainable for All – Projeto Europa no Mundo que financiou o E-Book já referido, foi possível através do suporte institucional da QUERCUS, uma vez que a plataforma nacional é uma rede informal de cidadãos. Foi também muito importante a divulgação feita pela Quercus à publicação, nas redes sociais e através do programa televisivo Minuto Verde.
A disseminação em Portugal da Declaração de Glasgow para a Alimentação e Clima foi possível através dos canais de comunicação da Quercus, e estimulada também pelos contactos da associação com os municípios Portugueses nomeadamente, no âmbito do Pacto de Autarcas para o Clima e a Energia.

A PLATAFORMA ALIMENTAR CIDADES SUSTENTÁVEIS
Fundada em 2018 a rede ALIMENTAR CIDADES SUSTENTÁVEIS pretende associar todos os atores e sectores do sistema alimentar nacional, reunindo atualmente 350 membros (2020). Tem como missão: (1): Partilhar conhecimento, fundamentado e plural, como instrumento para ampliar o entendimento da diversidade de sectores e atores, ao longo da cadeia que compõe o sistema alimentar; (2): Construção coletiva de conhecimento, como instrumento para qualificar as decisões e as políticas públicas que conduzam a sistemas alimentares com melhoria nos impactos ao nível ambiental e económico, e socialmente mais sustentáveis.
Para além da partilha de informação e de eventos realizada de forma individual e voluntária pelos membros deste “google-group”, são desenvolvidas pontualmente atividades e projetos entre as quais o e-book – Alimentar Boas Práticas: da Produção ao
Consumo Sustentável 2020 e debates mensais virtuais.

O E-BOOK – ALIMENTAR BOAS PRÁTICAS: DA PRODUÇÃO AO CONSUMO SUSTENTÁVEL 2020
A publicação do e-book – Alimentar Boas Praticas da Produção ao Consumo Sustentável 2020 inseriu-se nas atividades definidas como prioritárias pela plataforma nacional – Alimentar Cidades Sustentáveis. O e-book, lançado em Março 2020, compila 46 iniciativas nacionais que ilustram, de forma não exaustiva, o panorama das ações, projetos e programas do sistema alimentar nacional. O conjunto de iniciativas apresentado apresenta um leque extremamente variado e rico de áreas de atividade da cadeia alimentar em Portugal, designadamente: recursos e inputs agrícolas; produção; processamento; logística; comercialização; restauração; consumo; valorização de resíduos; sensibilização/educação; programas alimentares locais; marketing, e “outros”, que se autoalimentam internamente a partir das diferentes ações desenvolvidas pela iniciativa e que coexistem no território. A publicação que se espera vir a ser uma 1.ª Edição, demonstra a diversidade territorial das iniciativas existentes à escala nacional, intermunicipal, municipal e local (freguesias). À escala nacional sobressai o setor privado, mais habilitado à replicação das
iniciativas.
Há ainda um conjunto significativo de iniciativas à escala intermunicipal dinamizados frequentemente pelo terceiro sector. A maioria das iniciativas documentadas à escala municipal demostra o papel preponderante das autarquias na dinamização dos sistemas alimentares e a importância do envolvimento e vontade política para que as iniciativas aconteçam, sem desmerecimento pelas iniciativas desenvolvidas pelo terceiro sector, ativo, inovador e empenhado na mudança positiva dos sistemas alimentares, mesmo na ausência de políticas públicas que facilitem os processos. Por fim, mas não menos importante, o conjunto de iniciativas à escala local (freguesias) reforçam o papel preponderante da vontade política  a força e criatividade dos líderes locais na dinamização das iniciativas.

As iniciativas reunidas atestam ainda a multiplicidade de pontos de entrada do sistema alimentar que pode ter como alavanca o ambiente, saúde, formação profissional, redução da pegada ecológica, consumo consciente, emergência social, redução do desperdício alimentar, a manutenção da agricultura de proximidade, o estreitamento de relações de comunidade, etc..
O sucesso do e-book que ultrapassou os 1500 downloads em 6 meses (Abril a Setembro 2020) e os feedbacks extremamente positivos, justificam a continuidade da compilação que servirá para assegurar a necessária visibilidade, acompanhamento e reconhecimento da excelência, criatividade e inovação das iniciativas existentes.

A DECLARAÇÃO DE GLASGOW PARA A ALIMENTAÇÃO E CLIMA
Em Novembro de 2021, a COP26 em Glasgow irá enfrentar a monumental tarefa de colmatar o fosso entre os atuais compromissos climáticos dos países e as significativas transformações necessárias para enfrentar as emergências climáticas e naturais. O ímpeto está a crescer para ligar a alimentação, a natureza e o clima numa série de eventos chave a decorrer este ano, incluindo a primeira Cimeira da ONU sobre Sistemas Alimentares, tornando a COP26 uma oportunidade única para colocar a reforma dos sistemas alimentares na linha da frente do debate sobre o clima. Com os sistemas alimentares atualmente responsáveis por 1/3 das emissões globais de “Gases de Efeito Estufa”, está a tornar-evidente que não podemos cumprir o Acordo de Paris sobre o Clima assinado em 2015, sem incluir os sistemas alimentares. Contudo, a alimentação interceta diferentes áreas políticas o que conduz frequentemente a contradições e discordâncias políticas. A menos que todos os impactos dos sistemas alimentares sejam considerados em conjunto, as estratégias de mitigação e adaptação às alterações climáticas associadas à produção e consumo de alimentos serão provavelmente ineficientes.

Uma abordagem dos sistemas alimentares integrada considera a diversidade de atores e fatores socioculturais, económicos, biofísicos e institucionais subjacentes que moldam os nossos sistemas alimentares e facilitam o desenvolvimento de políticas coerentes, a resolução de tensões e a concretização da transformação dos sistemas alimentares, necessária para enfrentar os urgentes desafios ambientais e nutricionais.
Graças aos esforços na tradução da Declaração e do site para Português a Declaração já foi assinada por três municípios portugueses: Mértola; Torres Vedras e Maia. E pela cidade de São Paulo no Brasil.

O PRAZER DE FAZER PARTE DE UMA EQUIPA DEDICADA, ALTRUÍSTA E MOVIDA
PELO ESPÍRITO DE MISSÃO
A crise de 2011, que culminou com a entrada do FMI em Portugal, foi uma oportunidade para nos reinventarmos. Face ao cenário de decréscimo populacional na Europa, bolha imobiliária e crise financeira, tornava-se evidente uma mudança de paradigma. As cidades são cada vez mais o espaço de inovação, que exige uma visão multissetorial e multiatores e, neste sentido, construir pontes entre a academia e as organizações no terreno, como a Quercus impunha-se. Estes são também os princípios que norteiam a Declaração de Princípios da Quercus. A Quercus considera indispensável, para o cumprimento dos seus objetivos, o contributo da comunidade científica, e o exercício de um saudável espírito de interdisciplinaridade (princípio 8); norteando a sua intervenção cívica e política pelos valores da independência e da autonomia (princípio 5); e fundamentando as suas atuações no respeito escrupuloso pelo rigor e honestidade intelectual a que toda a crítica e/ou intervenção construtiva obrigam (princípio 6).
Resumindo, a liderança e o ambiente exigem convicção, coerência, ética e um conjunto alinhado de valores, algo que está presente na equipa dedicada de mulheres que lideram a Quercus. Fica o apelo a todos e todas para que se juntem a nós!

Mais informação disponível aqui:
Para fazer parte da Plataforma Alimentar
Cidades Sustentáveis: alimentarcidadessustentaveis@gmail.com
Para aceder ao E-book Alimentar Boas Práticas – da Produção ao Consumo Sustentável 2020: www.quercus.pt/ebook-alimentar-boas-praticas
Para aceder à Declaração de Glasgow sobre a Alimentação e o Clima:
pt.glasgowdeclaration.org/
Os resultados da investigação e os projetos desenvolvidos por Cecília Delgado estão publicados em vários artigos de revistas e capítulos de livros e podem ser consultados através do link: www.researchgate.net/profile/Cecilia-Delgado-4