Ana Povo: a mais nova diretora do Centro Académico Clínico ICBAS-CHUdSA

Ana Povo, adotada pela cidade do Porto quando decidiu estudar medicina, em 1996, é a primeira diretora do Centro Académico Clínico ICBAS-CHUdSA, um consórcio entre o Hospital de Santo António e o Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS). Para a cirurgiã, que relembra na mãe e na avó Margarida exemplos de dedicação e bondade, “um líder tem de saber ouvir e ter tempo para ouvir os que o rodeiam”, ainda que, como no caso dela, ocupe o tempo com outros cargos.

 

Desde muito cedo que quis ser cientista — o querer ser médica apareceu mais tarde na escolaridade. A matemática era a disciplina favorita até aos 14 anos, quando passava o verão a resolver problemas matemáticos, e a gestão parecia ser o melhor percurso devido ao “gosto pelos números”, afirma.

A cirurgia, assim como a medicina, só apareceu mais tarde no percurso académico.

Com o objetivo de aplicar as descobertas científicas ao tratamento do doente, Ana enveredou pela cirurgia geral por considerar a especialidade a mais completa de todas e não se limitar ao gesto cirúrgico.

Em 2017, pela ocasião da defesa da tese de doutoramento na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), a cirurgiã foi notícia pelo estudo e aplicação inovadora de um elétrodo estimulador dos nervos sagrados, em dois pacientes com malformação do sacro (osso na base da coluna vertebral), responsáveis, nestes casos, pela incontinência fecal e urinária.

 

Já com vários anos de experiência em medicina e no bloco operatório – o currículo desta líder conta com vários anos de internato no Hospital Pedro Hispano e experiência no Hospital de Santo António, e algumas clínicas privadas – Ana decidiu voltar a estudar. Aliás, nunca parou, como nos conta: “Sempre gostei de estudar, nunca vi o estudo como uma imposição ou obrigação, mas sim como um prazer de descobrir e aprender coisas novas.”.

Assim, com vários anos de docência, não só no ICBAS, onde se formou médica, mas também na FMUP, Ana seguiu para uma pós-graduação em gestão de organizações e sistemas de saúde, na Universidade Fernando Pessoa.

 

“O MBA surgiu pelo fato da importância de ganhar skills de liderança e gestão de equipas, áreas com que infelizmente não tive contacto durante o curso de medicina, e senti necessidade de desenvolver.”

 

Ainda que não seja a primeira mulher a assumir o cargo de diretora de um centro académico clínico, é a mais nova a assumir o cargo, como a própria confirmou.

Sem prejuízo da grande quantidade de trabalho que acumula, Ana revela ter dois grandes desafios: suceder no cargo ao seu exemplo de líder, o Professor Doutor Eurico Castro Alves, e a gestão entre o tempo de trabalho e o tempo de reuniões. “Um líder tem que saber ouvir e ter tempo para ouvir os que o rodeiam” afirma.

 

Apesar da menor dimensão, a cirurgiã já exerce há mais tempo um cargo de liderança durante a prática em clínica privada na Casa de Saúde da Boavista (CSB). Aqui, Ana teve a oportunidade de escolher cada elemento que trabalha na sua equipa, ambiente que difere bastante da estrutura e do âmbito maiores do Centro Académico Clínico, onde o desafio de “lidar com uma equipa verdadeiramente multidisciplinar: médicos, enfermeiros, investigadores, gestores, técnicos superiores, entre muitos outros” é um ponto de grande interesse para a cirurgiã, revela.

“Liderar no feminino é sem qualquer sombra de dúvida um caminho mais difícil. Não tenho qualquer problema em me considerar uma feminista.”

 

Ana nunca sentiu que as oportunidades lhe escassearam, não mais do que aos seus colegas do sexo masculino, ainda que tivesse sentido a necessidade de ser melhor.

Longe de ser caso único ou exclusivamente português, percebeu situações de esforço desigual, também, durante os estágios em Inglaterra e nos Estados Unidos e, embora o caminho lhe pareça longo, aproveita-o para se relembrar de outras mulheres, antes dela, e dos seus trabalhos – uma delas, sua orientadora de doutoramento e amiga, a primeira mulher diretora da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, Professora Maria Amélia Ferreira.

Para Ana, mais importante que as dificuldades e preconceitos, “só com verdadeira paixão, teremos uma verdadeira entrega” e é por isso que a própria acredita que ainda está longe do seu percurso. A médio prazo almeja fazer do ICBAS-CHUdSA um centro de referência nacional, ao mesmo tempo que não descura a vida pessoal – “É fundamental reservarmos tempo de qualidade para os nossos, e principalmente compensá-los depois de períodos de maiores ausências” esclarece.

“Em tudo na vida é preciso manter o equilibro, sendo este ainda mais fundamental quando se ocupam cargos de maior responsabilidade.”

 

À parte da total disponibilidade para o trabalho, a cirurgiã valpacense, criada em Vila Real e desde cedo a viver no Porto, aproveita o tempo livre para viajar, cozinhar, ler e escrever. Quando tem tempo, diz aproveitar para jogar golfe ou esquiar e tocar piano.

 

Um conselho: “Não é necessário criar barreiras entre a vida pessoal e profissional, pois ambas são partes intregantes de nós” e liderar como exemplo, como guia para uma equipa implica transparência, reflete.