A Ordem dos Psicólogos Portugueses tem tido um papel importante, desde o primeiro momento, aquando do início do surto na China, em articulação com a Direcção-Geral da Saúde, que criou desde esse primeiro momento um grupo de missão coordenado e formado por psicólogos para acompanharem e aconselharem a resposta da DGS ao nível comportamental. A Revista Liderança no Feminino, em conversa com Susana Almeida Lopes, membro da direção da Ordem dos Psicólogos Portugueses, foi conhecer as sua opinião.
“Todos nós, enquanto seres humanos, estamos condicionados a tomar decisões e a comportarmo-nos utilizando heurísticas e enviesamentos que funcionam como shortcuts para automatizar o comportamento, permitindo-nos sermos muito céleres e poupar apenas a proporção. Continuam a morrer muito mais pessoas diariamente por outras causas, mas não são notícias, e podemos, assim, desvalorizar a probabilidade, nesta fase, de padecer de outros males.
Outro enviesamento, é o de avaliarmos as situações de acordo com os nossos pontos de referência. Para quem está contagiado ou vive de perto situações de doença ou mesmo de fatalidade, esta doença é muito mais complexa do que para quem se mantém a salvo. Tal terá efeitos nos tipos de comportamento que as diferentes pessoas podem adotar em termos das regras de isolamento social, por exemplo.
Enviesamento interessante para este contexto é o da existência de um gap entre a nossa intenção e o nosso comportamento. Até colocamos no facebook uma notificação “eu fico em casa” e podemos ter a melhor das intenções, mas depois torna-se diariamente imperioso sair, e há sempre uma razão imperiosa, a ida ao supermercado, à farmácia, à peixaria, ao talho…
Também a nossa tendência para procurarmos evidências confirmatórias às nossas opiniões tem destaque na situação atual. Talvez por aqui se expliquem as diferenças de perspetivas acentuadas entre quem considera estarmos perante uma situação alarmante, acentuando o número exponencial de contágios e mortes; e quem considera que as medidas de isolamento são excessivas tendo em conta a baixa percentagem na população geral ou comparamos energia. Estes mecanismos têm, contudo, alguns revezes, dado que prejudicam a tomada de decisão lógica e racional, munida de todos os factos para uma tomada de decisão objetiva, não emocional e que maximize proveitos.
Esta pandemia põe-nos à prova na nossa humanidade, na nossa capacidade de superarmos a nossa própria condição e contrariarmos os nossos erros e enviesamentos, que são muitos. Destaco alguns, que deixo para reflexão.
Desde logo, o efeito de tomarmos decisões e elaborarmos conhecimento com base na informação que temos acessível no momento. A massificação de informação sobre a pandemia nos media faz com que a saliência dos números atinja proporções maiores do que são, de facto. E que julguemos, por exem- plo, uma probabilidade de contágio muito maior do que efetivamente é. Não retiro daqui a gravidade da situação, apenas a proporção. Continuam a morrer muito mais pessoas diariamente por outras causas, mas não são notícias, e podemos, assim, desvalorizar a probabilidade, nesta fase, de padecer de outros males.
Outro enviesamento, é o de avaliarmos as situações de acordo com os nossos pontos de referência. Para quem está contagiado ou vive de perto situações de doença ou mesmo de fatalidade, esta doença é muito mais complexa do que para quem se mantém a salvo. Tal terá efeitos nos tipos de comportamento que as diferentes pessoas podem adotar em termos das regras de isolamento social, por exemplo.
Enviesamento interessante para este contexto é o da existência de um gap entre a nossa intenção e o nosso comportamento. Até colocamos no facebook uma notificação “eu fico em casa” e podemos ter a melhor das intenções, mas depois torna-se diariamente imperioso sair, e há sempre uma razão imperiosa, a ida ao supermercado, à farmácia, à peixaria, ao talho…
Também a nossa tendência para procurarmos evidências confirmatórias às nossas opiniões tem destaque na situação atual. Talvez por aqui se expliquem as diferenças de perspetivas acentuadas entre quem considera estarmos perante uma situação alarmante, acentuando o número exponencial de contágios e mortes; e quem considera que as medidas de isolamento são excessivas tendo em conta a baixa percentagem na população geral ou comparativamente com situações anteriores mais graves: cada um vê os números que quer ver e desvaloriza os que infirmam as suas convicções.
Mas há um mecanismo que gostava de destacar. Contrariamente ao que nos diz a teoria da racionalidade clássica, nós, humanos, não agimos sempre para maximizarmos os proveitos próprios. E tal está refletido na cadeia de apoio social a que temos as- sistido. Os seres humanos são capazes das melho- res ações, em prol dos outros. Os profissionais de saúde estão na linha da frente, deixando para depois’ o cuidado da própria família. Várias organizações passaram a produzir os produtos necessários no combate à pandemia. Há informação jurídica disponível, webinars de formação gratuitos, avalia- ções online. Há toda uma abordagem de responsabilidade social ímpar que nos conforta.
Afinal, vale a pena termos enviesamentos e sermos humanos”.