Women Empowerment: Precisamos de fazer mais e mais depressa

Sandra Gil Mateus

É com frequência que me pedem referências de mulheres que trabalhem em tecnologia para candidatos a posições abertas. E na resposta nunca vai uma lista longa. E, apesar da minha lista não qualificar como amostra, não deixa de ser, para mim, um fator de preocupação e que reforça a voz que quero ter dentro e fora da Microsoft.

Na Microsoft, em todo o mundo apenas 29,7% da força de trabalho é feminina. E, sendo um valor baixo, em muito influenciado pela longevidade da empresa, representa um crescimento de 3% desde 2018, com especial incidência nas funções técnicas onde vemos um crescimento de 4% no mesmo período. Estudos apontam que nas empresas de tecnologia, em média, apenas 20%, são mulheres e que esta média reduz nos cargos mais altos com mais responsabilidade nas organizações.

É também facto que estamos a assistir nos últimos anos a sinais encorajadores que demonstram que existe efetivamente uma maior predisposição das mulheres para as carreiras de tecnologia. Recordo que na Websummit de 2021, as mulheres ultrapassaram 50% do total de participantes e, no evento Building the Future, contámos com mais de 40% de mulheres inscritas. Casos que saem reforçados pela análise da CIG – Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, onde, em 2020, 44% dos estudantes nas áreas das ciências, tecnologia, engenharia e matemáticas eram mulheres.

Apesar dos sinais encorajadores, sabemos também que a escassez de recursos femininos não é restrita ao sector da tecnologia, havendo muitos outros sectores da sociedade onde continua a ser visível a pouca expressividade das mulheres, com especial gravidade em cargos de liderança.

Precisamos de fazer mais e mais depressa.

No Building the Future, tive o prazer de moderar a talk “Voices of Women’s Empowerment”, dando voz a três plataformas que contribuem diariamente para a igualdade de género, tendo uma leitura muito concreta dos desafios e das necessidades para acelerar este equilíbrio.

A PWN Lisbon, parte da PWN Global, e onde sou membro da direção, trabalha para uma sociedade com maior equilíbrio de género, e conta atualmente com mais 1000 membros ativos. Estes membros, individuais ou parte de programas com parceiros corporativos, procuram o seu desenvolvimento profissional através de um conjunto de programas inovadores – Liderança, Mentoring, Women on Board, Engaging Men e Youth –, bem como com pequenos-almoços de networking, workshops e iniciativas de role model com personalidades de referência nos mais diferentes setores do tecido empresarial português.

Contámos também a iniciativa da CIP – Confederação Empresarial de Portugal, que no seu projeto Promova, em parceria com a CIG, com o objetivo de identificar e desenvolver talentos femininos com potencial de liderança, contribui para a sua promoção e ao acesso a lugares de topo. Incluindo um programa de formação de um ano, sessões de formação, coaching, mentoring e mindfulness e networking, estando já na segunda edição do projeto, da qual também faço parte. Este projeto é também acompanhado por uma discussão aberta no seu podcast e por inúmeras publicações e testemunhos de mulheres.

As plataformas iGen e Grace são abertas a todas as empresas e organizações que pretendam desenvolver práticas de igualdade de género. O Grace apoia os associados na jornada da igualdade com diferentes atividades para o desenvolvimento dos seus colaboradores. No forum iGen, onde represento a Microsoft, e que através de um esquema rotativo de liderança de mais de 60 organizações, são desenvolvidas atividades que reforçam o compromisso das organizações associadas na constante incorporação na sua missão, nas suas políticas e na sua cultura, uma constante procura da igualdade de género.

Nestas três plataformas, e que atuam todos os dias no terreno, é visível que apesar da aposta constante das organizações há ainda muito por fazer. Começamos pelo início da vida, onde há ainda um enviesamento na educação onde persistimos nas diferenças estruturais de género, seja no vestuário, na cor ou no tipo de brinquedos e jogos didáticos que predominam no nosso ensino e que são distintos no género. E seguem pela vida escolar, continuando a existir uma predominância do sexo masculino na educação científica e tecnológica, sendo o sexo feminino direcionado para áreas e profissões onde existe menor empregabilidade, comprometendo o futuro dessas jovens e mulheres. É exigida e necessária uma orientação vocacional de quem conheça o ambiente empresarial, sendo necessário criar pontes e interligação entre o ambiente escolar e o profissional, conhecendo cada vez melhor e mais cedo as profissões e a panóplia de opções que existem na nossa sociedade.

É também necessário apostar nas políticas públicas de conciliação da vida pessoal e profissional, quer ao nível do apoio familiar, como na logística e apoios indiretos. Cada empresa deve incluir a diversidade na sua estratégia, implementando medidas concretas que contribuam para o dirimir da desigualdade, como, por exemplo, através de formação especifica para contrariar o enviesamento inconsciente que, sendo inconsciente, continua a impactar negativamente os avanços da igualdade. Outras medidas como garantir a igualdade nos processos de recrutamento e seleção, a constante análise à equidade salarial e às avaliações de desempenho são absolutamente essenciais.

O longo caminho que nos falta fazer como sociedade, carece também do compromisso individual de cada mulher e de cada homem, tendo uma voz ativa no trabalho, na sociedade e no seio familiar, contra a discriminação e a diferença, por mais pequena que pareça. O associativismo e o networking são ainda também fatores pouco priorizados pelas mulheres, mas representam espaços de partilha e de desenvolvimento, que contribuem ativamente para o sentido de comunidade e entreajuda, bem como de inspiração e desafio. Inspiração que incentiva as mulheres a deixar a sua zona de conforto, correndo mais riscos e, com isso, atingindo também níveis elevados de sucesso, progressão e realização pessoal e profissional.

Cada um de nós e cada uma das nossas organizações públicas e privadas tem um papel a desempenhar.

Na Microsoft, lidero o Women ERG (Employe Resource Group) em Portugal. Os ERG são grupos de voluntários, que atuam nas diversas áreas da diversidade e inclusão – como a etnia, deficiência, sustentabilidade, entre outros – e que visam contribuir para acelerar a diversidade e inclusão em toda a empresa.

A nossa missão na Microsoft é capacitar cada pessoa e cada organização no planeta para atingir mais. E, como refere o nosso CEO, Satya Nadella, não o poderemos fazer se não tivermos uma representação do planeta dentro da Microsoft.

O Women ERG tem como missão acelerar a nossa jornada cultural atuando para o aumento da inclusão, pertença, equidade e representação das mulheres e todos os que se identifiquem como mulheres, em todas as raças, etnias, capacidades e percursos. Temos como prioridades liderar, ligar, inspirar e amplificar o papel das mulheres e o seu impacto no universo da Microsoft; contribuir ativamente para criar e desenvolver produtos e serviços mais inclusivos e, ainda, dar voz às mulheres, influenciado as políticas corporativas para uma maior igualdade.

No Microsoft Teams podemos aderir a diversos grupos, locais, regionais ou globais, onde se encontram inúmeras atividades que contribuem para a jornada que se pretende percorrer. No Global Women ERG há pedidos de voluntários para mentoring de mulheres líderes de start-ups, publicação de vagas, grupos de partilha e discussão sobre menstruação e menopausa, entre muitos outros tópicos, e até um clube de leitura. Há também grupos de suporte para mulheres solteiras, grupos para apoio a quem regressa da licença de maternidade, para quem está em carreiras técnicas, e o acesso a inúmeros eventos e comunicações, que visam apoiar as mulheres e simultaneamente aumentar a perceção da diferença e crescer na sua inclusão, independentemente da situação pessoal de cada uma.

Em Portugal, o Women ERG, reúne um conjunto de voluntárias, com um sponsor executivo da comissão executiva da Microsoft Portugal, e que organizam e executam atividades que alinham com a nossa missão. Definimos como prioridade no primeiro ano aumentar, interna e externamente, o conhecimento dos desafios da diversidade e atrair e inspirar aliados que permitam criar e desenvolver cada vez mais uma cultura diversa.

Como parte dessas iniciativas, e tendo por base um trabalho desenvolvido por um dos membros, criamos uma série de Workshops de empoderamento, que contam com temas como autopromoção, networking, riscos, competências de negociação, gestão de situações difíceis e a política organizacional e que se tornam espaços de partilha e conhecimento muito enriquecedores para homens e mulheres que participam.

Estamos a prepararmos para a celebração do Dia Internacional da Mulher onde teremos o mês de março dedicado à diversidade de género e, onde, desafiados pelo nosso novo diretor geral, queremos ter impacto interno, mas também externo à organização. A Microsoft Portugal tem um vastíssimo grupo de parceiros reconhecidos que partilham da mesma visão de diversidade e, juntos, como organização global e líder mundial temos o dever de inspirar e acelerar o papel das mulheres nas organizações e na sociedade. E queremos envolver todo o ecossistema para juntos conseguirmos atuar interna e externamente, por exemplo, na descoberta e voz de líderes mulheres inspiradoras e no incentivo, desde as escolas, às carreiras nas áreas das ciências, tecnologia, engenharia e matemáticas, nomeadamente através do conhecimento do que efetivamente são essas profissões na atualidade.

Todas as organizações e todas as áreas da nossa sociedade têm um papel a desempenhar, começando por cada um de nós em todos os aspetos da nossa vida. E não nos referimos apenas a inclusão ou à tolerância para com o outro. É preciso também ter curiosidade. Não se trata da medição, por exemplo, do valor das mulheres nos negócios, mas sim da disponibilidade e curiosidade das organizações para procurar, envolver ativamente e escutar quem é diferente. Porque é na diferença, nos ambientes multiculturais, em constante curiosidade e criatividade, que se cresce, desenvolve e evolui.

Acredito que seremos uma tão melhor sociedade para nós e para os nossos filhos se vivermos e trabalharmos em comunidades diversas, plurais e multiculturais onde se incentiva a criatividade e o desenvolvimento da inspiração pelo outro.

E não precisamos de ser todos grandes visionários ou esperarmos grandes momentos transformadores. Passa pelas nossas ações diárias, quer como mulheres que correm riscos e questionam o status quo, quer como sociedade que incentiva e premeia a pluralidade, todos os dias em todas as áreas.

Como mulher, mãe e profissional, sinto todos os dias o ímpeto para contribuir nessa mudança, seja na educação do meu filho, na gestão da vida familiar e na vida profissional. Sou licenciada em gestão e tenho uma carreira maioritariamente em organizações com forte componente tecnológica, nomeadamente em organizações multinacionais, onde pode ser assumido que há já um avanço significativo na diversidade e inclusão. No entanto, não é esse suposto avanço que me tranquiliza. Há sempre na liderança um sentido acrescido de responsabilidade pelo seu impacto. E vejo na Microsoft, e no seu papel de líder tecnológico, a responsabilidade pela sua contribuição para um mundo mais diverso e inclusivo, que passa pelo Women ERG, mas também pelo papel de todos na Microsoft junto de parceiros, clientes e na sociedade. E por mais pequenas que sejam as ações, como garantir nos próprios eventos a diversidade de oradores ou participar apenas em eventos com diversidade, gera consciência e gera mudança.

E é na curiosidade do outro e na procura constante de desenvolvimento e aprendizagem que nos últimos quatro anos trabalho com voluntária na PWN Lisbon, angariando parceiros corporativos, que aceitei sem reservas a participação no programa Promova, bem como a representação da Microsoft no forum iGen, enquanto lidero o Women ERG. E sendo atividades que paralelizo com o ritmo profissional e a vida pessoal, sinto que a equação é sempre favorável, aprendendo e crescendo todos os dias.

É no papel individual que está a mudança e a evolução coletiva. Cabe a cada um estabelecer e encontrar o seu papel e a sua contribuição para uma sociedade mais diversa, inclusiva e, acredito, cada vez melhor.

E como escreveu José Saramago, “Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo”. Precisamos fazer mais e mais depressa. Todos.