A CRISE AMAZÓNICA

A floresta que abriga 2500 espécies de árvores e 30 das 100 mil espécies de plantas que existem em toda a América Latina, é notícia diária devido à imprudência proveniente do Homem, possível de causar danos irreversíveis no ecossistema.

Apesar de diversos estudos trazerem a mote que o verdadeiro pulmão do planeta terra encontra-se nos nossos oceanos, a Amazónia é uma floresta, um gigante tropical de 4.1 milhões de km2, que vive do seu próprio material orgânico. O Brasil, apesar de aclamado como o país de maior diversidade biológica do mundo, tem a sua riqueza sob constante ameaça, sendo o desmatamento anual da Amazónia, as queimadas, a conversão das terras para a agricultura e os empreendimentos realizados em áreas ainda preservadas, das maiores problemáticas. Embora o Brasil tenha uma das mais atuais legislações ambientais do mundo, ela parece insuficiente face à devastação da floresta. A insuficiência de recursos humanos para fiscalização, a dificuldade na monitorização de determinadas áreas e a fraca administração das áreas protegidas, bem como, o deficiente envolvimento da população local são as carências mais acentuadas da região.
A ocupação da região amazónica intensificou-se na década de 40, quando o governo implementou estímulos para esse efeito. Com estas medidas, as queimadas e o desmatamento tornaram-se cada vez mais frequentes. A representação destas medidas repercute em mais de 12% de área original destruída.

Ao longo dos últimos anos, a Amazónia tem sido negligenciada. Interesses de entidades diversas têm-se sobreposto ao fator ambiental e, exemplo disso, são as implementações das centrais hidroelétricas. A discussão em voga remete para a relação do Brasil com os países do G7, o grupo das sete nações mais industrializadas do mundo.
Este grupo disponibilizou uma ajuda imediata de 17.95 milhões de euros para combater os incêndios na maior floresta tropical que, se por um lado uns consideram ser do planeta e não somente de um país, por outro lado, o povo brasileiro almeja que os estrangeiros abandonem, por fim, as suas terras. Após a cimeira decorrida em França, Macron, presidente desta, questionou a estratégia do Governo brasileiro sobre a Amazónia e reage com a defesa de que a questão tem um estatuto internacional. A maior floresta tropical do mundo inclui territórios não somente do Brasil, como do Peru, Colômbia,
Venezuela, Equador, Bolívia, Suriname e Guiana Francesa. Convém não esquecer que, infelizmente, não somente a Amazónia sofre com os incêndios.

A República Democrática do Congo, tal como Angola, registam no espaço de dois dias, quase cinco vezes mais fogos do que os registados no Brasil, tirando a Amazónia do primeiro lugar do número de incêndios. Segundo a Globral Forest Watch Fires, no período entre 19 e 26 de agosto, foram registados cerca de 135 mil alertas de fogos em Angola e, 104 mil alertas na República Democrática do Congo, sendo que 88 mil remetiam para alertas no Brasil. Obviamente que a observação que acabamos de fazer não minimiza o impacto dos fogos no Brasil, contudo, serve de alerta para a intensidade e modo como a comunicação foi exteriorizada por todo o mundo. A discrepância das atenções entre uns e outros fogos foi mote de controvérsia, principalmente nos veículos sociais. Atualmente ainda não é conhecida a área ardida circundante à Amazónia, contudo, muitas são as especulações e sabemos que, até final de julho, aproximadamente 18 mil km2 tinham ardido (INPE). Apesar da estação seca ser propícia a desencadear incêndios, verifica-se que apenas uma pequena parte dos fogos não terá causas naturais. O diretor da organização sem fins lucrativos Amazon Watch, Christian Poirier, afirma mesmo que a grande maioria dos incêndios tem origem humana, remetendo para o facto das atividades pecuárias e agrícolas utilizarem os fogos para limpar a terra e a deixarem pronta para uso, como justificação para o crescente número de queimadas.

Segundo Malhi, professor de Ciência de Ecossistemas da Universidade de Oxford, se 30 ou 40% da floresta Amazónia fosse devastada pelo fogo, haveria a possibilidade de alteração de todo o clima da floresta, sendo que esta leva 20 a 40 anos a regenerar-se.
Note-se que cerca de 80% da Amazónia ainda é floresta virgem. E, embora a regeneração esteja presente, os fogos constantes e de grandes dimensões poderão levar a danos permanente e irreversíveis.

Um dos danos permanentes que podem ter um impacto global a longo prazo, contribuindo para o aquecimento global, prende-se com o monóxido de carbono libertado pela madeira das árvores queimadas, que se traduz numa enorme preocupação, sendo que a América do Sul sentirá o efeito imediato no clima, levando à chuva reduzida e, consequentemente, à intensificação da estação seca. Falar da Amazónia, sem falar das tribos indígenas, a discussão não fica completa. As tribos vivem e dependem inteiramente das terras. Segundo as notícias divulgadas, cerca de 148 terras indígenas estão ameaçadas pelo fogo na Amazónia. A discussão sobre a política ambiental que recai sobre o governo brasileiro insinua que existiram erros na gestão desta problemática. É de conhecimento público que a devastação da Amazónia pelos fogos é, nesta altura, comum. A situação repete-se ano após ano, como confirma o vice-presidente Hamilton Mourão. O Presidente Jair Bolsonaro decretou a proibição de queimadas durante dois meses e aprovou o recurso aos militares para ajudar no combate ao fogo. Contudo, são várias as tribos que continuam em perigo eminente, sendo que muitas estão em locais pouco acessíveis e, outras, ainda sequer desconhecidas. O que se discute agora é que chegou o tempo de deixar a casa Amazónia descansar, sendo que os ativistas e parte do povo brasileiro defende que chegou a hora de dizer “basta”, de explorar a floresta que é sua, em prol da sustentação da economia de países como a França, Alemanha, entre outros. Com o olhar e a consciência ativos, algumas marcas fizeram questão de comunicar que encerravam agora as suas práticas de compra de matéria provinda da Amazónia, como é o caso da VF Corporation, a empresa americana que detém marcas de vestuário e calçado como a Timberland ou a Vans, declarando que não vai comprar mais couro do Brasil até garantir que a produção dos materiais que importa, não prejudica o meio ambiente.

No estado de Rondónia, o que resta de uma boa parte da floresta Amazónica reduz-se a cinzas. O bioma mais afetado no país já se tornou visível através de manchas de fumo captadas pela NASA. Nas imagens registadas, verificam-se quatro dos oito estados que a Amazónia ocupa no país. Ainda que o estado atual seja crítico, a NASA confirma que o registo de incêndios ocorre nos diferentes países, sendo que ainda se encontra ligeiramente abaixo da média, em comparação com os últimos 15 anos. Mato Grosso revela-se como o estado mais afetado, com mais focos de incêndio registados, com 13.999, seguindo-se pelo estado do Pará, com 9.818 que, neste caso, já é o país com maior número de incêndios nos últimos sete anos.

A controvérsia das ONGs

Polémica é a discussão sobre o papel das Organizações Não Governamentais (ONGs), a qual o próprio Presidente acusa de ações ilícitas na propagação dos incêndios. Em causa estão os cortes nos apoios governamentais que, eventualmente, poderão ter motivado estas entidades a instigar os incêndios florestais, com o intuito de prejudicar o atual governo. Na falta de provas que sustentem estas acusações, o Presidente arremata que a falta de dinheiro leva as pessoas ao crime. Já Alberto Setzer, pesquisador, explica que o clima no ano de 2019 está mais seco que o ano anterior, originando mais incêndios, mas garantindo que grande parte deles não tem origem natural, sendo sim, proveniente das queimadas. Isto é, de forma acidental ou propositada, a conclusão é comum: a origem está na atividade humana e a intensificação da seca que se prevê pode ainda agravar a situação atual. A atividade das ONGs é colocada em causa, quer pela internacionalidade que têm na sua origem, que leva a interesses económicos que se sobrepõem aos interesses da floresta, dos seus animais e do seu povo, quer pela intervenção apenas direcionada à Amazónia. As informações são diversas e é preciso um olhar atento, uma curiosidade sobre procurar a informação fidedigna. Se por um lado se afirma que na Amazónia existem 100 mil ONGs em atuação em contraposição com nenhuma na região do Nordeste, que carece de problemáticas várias, nomeadamente a fome e pobreza extrema, por outro lado, outras informações afirmam que esta indicação é falsa, reafirmando que existem 15.919 ONGs na Amazónia e 44.496 no Nordeste brasileiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, à data do ano de 2016. Já o Mapa das Organizações da Sociedade Civil (OSC) do IPEA também traz números contraditórios, levando uma contagem de ONGs presentes no Nordeste superior às que atuam na floresta tropical. Contudo, mesmo esta análise quantitativa do número de organismos a atuar junto destas áreas, varia de entidade para entidade, dificultando a leitura de quem pretenda perceber um pouco do que se passa na Amazónia. No entanto, esta discussão sobre o império das ONGs e o loteamento da Amazónia passa a estar de olhares e dedos mais atentos e voltados sobre si. Entre comunicados e informação dispersa e diversa, na luta pela Amazónia que pertence a todos e a Amazónia que pertence aos locais, na conspiração e pelos que lutam de momento frente às chamas, todos se encontram em congruência: a floresta tropical é única, rica, insubstituível. Cabe melhorar a gestão da sua ocupação, da utilização da sua terra e dos seus recursos. Acima de tudo, deve a cada um a sua pequena mudança, por um planeta que é de todos.

Por Catarina A. Fernandes