Designer gráfica e ilustradora há mais de 15 anos, o seu percurso começou no Brasil, teve uma paragem pelo Japão e aterrou em Portugal. Criou a Woolf Studio, estúdio de design com foco no empreendedorismo feminino, sem medo de enfrentar desafios e intuito de parar por aqui.
Louise Kanefuku, fundadora da Woolf Studio, é designer gráfica e ilustradora há mais de 15 anos. Nasceu no Brasil, onde se licenciou em Artes Visuais na Universidade do Rio Grande do Sul. Conseguiu desenvolver-se profissionalmente com condições favoráveis, brindo a sua própria empresa aos 23 anos. O Brasil não é um país fácil de viver, conta Louise, mas oferece muitas oportunidades para quem tem uma boa rede profissional. Aprendeu a ser empreendedora, resiliente e disciplinada, algo muito importante “ num contexto onde a economia é mais instável.”
UMA CARREIRA VIAJADA
Graças a um programa do governo japonês, morou no Japão durante seis meses, beneficiando de uma bolsa. Para a designer, em cada lugar se aprende coisas diferentes, tendo em conta “o momento de vida e as condições que temos em determinado local.” Apesar da estadia curta estadia, sentiu a diferença de viver num país seguro e com uma economia estável, onde existe mais para ir e vir e os preços são mais constantes. Trabalhou numa gráfica, onde aprendeu a respeitar processos, cumprir horários e dar atenção aos mais pequenos detalhes: “No Japão, o visual das embalagens, publicações e anúncios é fortemente influenciado pelas estações do ano. Na primavera, por exemplo, todas as embalagens estão cobertas de flores de cerejeira e isso tem uma finalidade comercial, mas, ao mesmo tempo, é poético que as pessoas se deixem sensibilizar por isso”, esclarece Louise.
O Japão é distinto pela sua cultura de idolatria ao cliente, que Louise acha ligeiramente exagerada, mas que acabou, inevitavelmente, por absorver um pouco. Chega até ser um pouco engraçado para si, partilhando uma das histórias que considera mais caricatas: “Por um sinal de respeito, não se deve virar as costas ao cliente. Então, quem faz o atendimento, quando precisa deixar a sala, por exemplo, vai andando de costas até a porta, para não ficar de costas para o cliente.”
Mais tarde, com vontade de voltar a apostar na formação, mudou-se para Portugal para tirar o mestrado em Artes Plásticas na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. No mundo artístico, é importante “ ter conhecimento do panorama geral da História, para saber em que ponto dessa grande narrativa estamos atuando e podermos ‘entrar na conversa’; receber a crítica e as sugestões dos professores e dos colegas.” É como um grande laboratório, resume. Para além da formação ser importante para a inserção no mercado de trabalho, a academia é um local de criação de contactos. Louise revela que conheceu muitos dos seus melhores amigos na faculdade e que ainda hoje trabalha com profissionais que conheceu nessa altura: “É uma ótima maneira de conhecer pessoas que partilham dos mesmos interesses e aspirações.”
Em Portugal, viveu uma realidade muito diferente – a do imigrante. Paralelamente ao mestrado, tentou entrar no mercado de trabalho português. Começou por procurar em cafés e restaurantes, sem sucesso. Em empresas teve o mesmo desfecho. Louise relembra que pela primeira vez sentiu o preconceito contra brasileiros: “Foi bastante difícil de lidar, porque nunca tinha vivido na pele pertencer a uma população desprivilegiada.”
Apesar desse primeiro impacto, foi no Porto que conheceu o“ valor da solidariedade”, principalmente entre mulheres. Também aprendeu a diminuir o ritmo e a ter mais paciência. “Acho que o brasileiro está acostumado a viver num ritmo muito acelerado que, num primeiro momento, entra em conflito com a cultura local. É bom aprender a viver esse outro tempo, com mais respiro e menos ansiedade. Respeitar o tempo de maturação das ideias e o tempo dos outros.“ Destaca o ar romântico da Cidade Invicta, onde “as ruas têm nomes como Saudade e Alegria, os muros têm frases poéticas e intervenções artísticas, e um respeito pelo que é antigo, pela história das coisas, que é muito bonito.”
É nessa beleza do mundo que a rodeia que Louise encontra inspiração, “tudo influencia e pode inspirar o nosso trabalho – a leveza de uma folha, o movimento do tecido.” A beleza das coisas transmite-lhe calma e estabilidade, algo que acredita estar em falta nos tempos em que vivemos.
VALORIZAÇÃO DA MULHER EMPREENDEDORA
No mundo dos negócios, a sua inspiração surge de outras mulheres empreendedoras que segue, nas redes sociais principalmente: “Não são profissionais consagradas ou ricas, mas estão trabalhando diariamente para ter autonomia financeira e por uma causa.”
“O ‘normal’ no mercado do trabalho é procurar estabilidade num emprego,” cumprir as tarefas receber um salário, ter férias”, algo que não critica; empreender é fora do comum. Quando a empreendedora é uma mulher, “muito provavelmente é porque ela tem uma história por trás dessa decisão que lhe dá forças para romper com esse primeiro normal e ainda com o segundo, que é o do cargo de chefia ser predominantemente masculino.” No caso de Louise, ainda existe um terceiro fator – mulher empreendedora imigrante, que requer ainda mais força, na sua opinião.
Por isso mesmo, Louise acredita que o Dia Internacional da Mulher continua a ser extremamente importante, sendo uma data “com uma relevância histórica, que valoriza a luta pela igualdade entre os géneros e a torna ainda mais conhecida.” Desde os grande movimentos de rua que mobilizam milhares de mulheres nesse dia, e onde “podemos sentir a força delas, nos gritos, nos rostos, na união”, que serão sem dúvida diferentes este ano tendo em conta a pandemia, até a elementos mais simbólicos, que “pouco a pouco moldam uma cultura, possivelmente para melhor.” No dia 8 de Março, Louise irá fazer a abertura da sua exposição na Abreu Advogados com uma conversa com Isabel Sabina, outra mulher artista. A ideia surgiu em função da data e a designer acredita que estes pequenos gestos valorizam o trabalho da mulher e podem inspirar outras “é como uma pedra que cai na água mas vai reverberando.
SER ARTISTA NO MEIO DE UMA PANDEMIA
Louise trabalhou como freelancer durante vários anos. No início da pandemia, os seus rendimentos provinham maioritariamente de oficinas de aquarela, feiras de rua e trabalhos artísticos, estando menos focada em serviços de design.
Assim que terminou o mestrado, e com a impossibilidade de trabalhar na rua ou realizar oficinas, finalmente se dedicou à criação do estúdio – Woolf Studio – uma ideia até então estava em amadurecimento.
Afetado profissionalmente pela pandemia, o seu companheiro juntou-se ao projeto, auxiliando nas áreas de programação, animação e vídeo. Ao trabalharem juntos conseguiram equilibrar o lado financeiro e, consequentemente, criar um ambiente mais harmonioso em casa. Ter estabilidade financeira é algo importante no processo de criar. Para Louise, essa é uma das dificuldades dos artistas em geral: “não é possível criar tendo preocupações referentes às necessidades básicas.”
De momento, está a desenvolver um trabalho para a BMW Foundation do qual se orgulha bastante: “Toda essa energia, a perspectiva de ter bons trabalhos, em que somos criativamente desafiados e ao mesmo tempo valorizados, é bem estimulante para a criatividade. Parece que uma coisa boa vai puxando a outra. “ Para o futuro, tem planos de conseguir novas clientes para que mais mulheres possam encontrar realização profissional, além de se tornar nómada. Claramente, Louise não é mulher de recusar desafios ou viver pelo seguro.