Estas últimas semanas o mundo está mais cor de rosa e a razão é a barbiemania a que ninguém escapou nos cinemas, na rua ou nas redes sociais.O budget parece saído da BarbieLand: mais de 150 milhões de euros em marketing, um budget surpreendentemente superior ao budget de produção do filme – na ordem dos 145M€.
Mas à parte do investimento em produção ou marketing, o filme parece conter os atributos essenciais para criar viralidade e conversação nas redes sociais, segundo Eric Pallota, ex-colaborador da Netflix:
- O apelo nostálgico, fazendo com que milhões de adultos queiram reviver no cinema, a boneca de infância que de alguma forma as influenciou a ser quem são.
- Afinidade com o target online, intergeracional, através de uma forte presença nas redes socais, com uma estratégia de lançamento gradual de informação e conteúdos meme sobre o filme,
- Forte branding visual mas também sonoro. Uma reinvenção da cor rosa e a famosa frase “Hi Barbie” em repetição
- Abordagem a temas sócio políticos. Mesmo com uma narrativa adulta na abordagem a temas sociais, o conceito da história é de consciência coletiva e influência positivamente as futuras gerações. A luta contra os “estereótipos”, as expectativas irrealistas depositadas nas mulheres, a diversidade, inclusão, o papel atual da mulher e do homem no mundo profissional
- Elenco e equipa com influência social. O filme conta com um dos brinquedos mais desejados de diversas gerações, mas também com a realizadora vencedora de óscar muito popular nas gerações mais jovens Greta Gerwig, e os atores e artistas musicais mais aclamados e no auge das suas carreiras como Margot Robbie, Ryan Gosling, Lizzo, Billie Eilish, Dua Lipa e Nichi Minaj & Ice Spice)
Contudo o mundo da Barbie não foi só cor-de-rosa nos últimos anos. A verdade é que o digital trouxe desafios para a boneca mais emblemática do mundo na última década, e a marca estava a perder a liderança e a influência nas novas gerações. Em resposta, a Mattel modernizou-se com uma forte presença e pegada digital, e reinventou a famosa Barbie em novas versões mais inclusivas e alinhadas com as mais atuais temáticas sociais como o empoderamento e representatividade feminina em vários papéis profissionais, diversidade de corpos, tons de pele e condicionantes físicas, mas foi o clássico cinema que este ano veio reacender a marca icónica, com um storytelling atual e que em muitos momentos tem a capacidade de brincar com a sua própria história.
Há algum tempo que não presenciávamos uma estratégia de promoção de um filme de cinema tão bem-sucedida. É inegável que as informações e as imagens relacionadas com o filme foram estrategicamente lançadas de forma gradual e consistente, para criar esta aura cor-de-rosa que vivemos. Mas não foi apenas sobre o filme. O CEO da Mattel, Ynon Kreiz, reportou mais de 165 parcerias com marcas que capitalizaram no momento e criaram campanhas, produtos e serviços com benefício para ambas as marcas a nível de vendas, menções nas redes sociais e impacto mediático.
- A AirBnB trouxe para a realidade a experiência de dormir na mansão de sonho da Barbie em Malibu,
- Na Polónia e Roménia por exemplo, a Uber ofereceu viagens gratuitas no Cadillac DeVille para os fãs que iam ver o filme, que por sua vez geraram uma enorme amplificação nas redes sociais, através de conteúdos criados pelos utilizadores.
- A Zara e a Primark, criaram coleções de roupa Barbie, potenciadas por influenciadores de moda e aumentando a mancha rosa em todo o lado,
- A Forever 21 lançou também uma linha de roupa mas foi mais longe a criar um mundo virtual no Roblox
- A XBOX fez um enorme Buzz oferecendo os carros do Ken e da Barbie no jogo Forza Horizon 5
- A edição limitada de produtos de maquilhagem da marca NYX Professional Makeup,
- A Burguer King criou o menu da Barbie, com packaging temático, pink burgers, milkshake especial e donuts rosa, e em São Paulo, inclusive, transformou um dos restaurantes, numa casa rosa.
- A Birkenstock, entra no filme com o seu clássico modelo Arizona, associando-o aos atributos de conforto e autenticidade do mundo real
- E tantas outras colaborações, parcerias, e campanhas time to market criadas por outras marcas que decidiram não perder o momento para interagirem com os seus fãs.
Nas lojas FNAC, também criámos “Barbie Corners” com a seleção de produtos do universo Barbie, desde as famosas bonecas, acessórios, e até o novo vinil que inclui a banda sonora do filme. Na loja do Centro Comercial Colombo também podem encontrar a famosa (e gigante) caixa da Barbie cor-de-rosa para tirar fotos 100% instagramáveis.
Todo este buzz criado trouxe resultados que são um verdadeiro caso de eficácia e que trouxeram a marca Barbie para a liderança novamente.
. os media reportam que no primeiro fim de semana no cinema realizou mais de 155 milhões de dólares (140 milhões de euros);
. as ações da Mattel dispararam 33% no mês que antecedeu a estreia, segundo a fortune.com
. a empresa atualizou a previsão de vendas para 2023, com crescimento total de 1,7%, estimando vendas na ordem dos 1,52 mil milhões de euros, a ocorrer no 2º semestre;
. segundo a Semrush, o perfil do filme no Instagram gerou mais de 661K seguidores em apenas 60 dias;
. em termos de SEO, foram criados cerca de 494K novos backlinks para a página do filme;
. as pesquisas mensais por Barbie atingiram 2.6 milhões versus as 440 mil pesquisas para o filme;
. e já há produtos Barbie no top semanal de artigos mais vendidos de alguns sites de venda online.
Mais impressionante, é o sucesso orgânico que o filme conseguiu. O mundo real pintou-se de rosa, a cor oficial do dress code para ir ver o filme ao cinema.
Amigos, equipas e comunidades criaram motivos de celebrarem juntos numa ida ao cinema, como foi o caso da inspiradora marca portuguesa Mahrlastore, que juntou a sua comunidade de clientes para assistir ao filme Barbie, vestidas com a peça icónica Jules, em tons de rosa.
Esta pink fever é uma verdadeira prova do sucesso da estratégia da Mattel.
Mas para mim, este filme vai muito além de um filme de bonecas ou um filme cor-de-rosa.No meio do humor e da ironia inteligente do filme da Barbie, vi lições de liderança capazes de inspirar, construir relações mais fortes e desenvolver um caminho mais feliz, durante a jornada de liderança.
- O autoconhecimento de um líder é transformador
Para sabermos onde queremos chegar, precisamos de ter consciência dos nossos pontos fortes e dos pontos a melhorar. A Barbie, tal como o líder, quer descobrir a verdade, sem se limitar ao que os outros esperam, e que a condicionam a viver numa bolha. Ser feliz é diferente de viver dias felizes. E para isso, é preciso a autoconsciência sobre o que nos faz mais felizes. Esta consciência pode requerer coragem para mudar, para transformar as rotinas dos dias “felizes” e previsíveis que conhecemos.
- Na liderança não há sombras porque o líder deixa brilhar.
O respeito pela individualidade, o reconhecimento e valorização do papel de cada pessoa, potenciando o melhor de cada um é determinante para uma viagem de liderança mais feliz. Sem criar dependências e sem fazer sombra à nossa volta. A Barbie tinha um óptimo dia todos os dias, mas o Ken só tinha um óptimo dia se a Barbie olhasse para ele. Depois da sua viagem transformadora ao mundo real, a Barbie percebe e dá a confiança ao Ken para ser quem é, sem que dependam obrigatoriamente um do outro.
- Na liderança é preciso ir mais além
Muitas vezes, vivemos num mundo redondo e perdemos a capacidade de ir mais além. A Barbie vivia uma vida estereotipada até ter a capacidade de perceber que a verdade podia estar fora da Barbieland. Esta capacidade de quebrar as expectativas dos outros e a coragem de perseguir as suas paixões e ambições, sem medos, acaba por ser uma fonte de inspiração para todos à sua volta e encoraja os outros a verem o seu próprio mundo com outros olhos. “Eu quero fazer parte das pessoas que fazem sentido, não das coisas que são feitas” – e no final do filme a Barbie descobre que não quer ser um ideal que inspira, quer ser uma mulher de verdade que faz coisas inspiradoras.
- O líder também chora.
Assim como a Barbie, um líder pode viver momentos de auto-crítica e julgamento. Assim como a Barbie viveu este momento quando dúvida dos standards de beleza impostos, os líderes podem vivê-lo com as suas ideias, execuções e até na ambição que colocam em projectos, projeções e equipas.
A Barbie menciona que aprendeu a chorar – “primeiro caiu uma lágrima e depois caíram muitas” e o Ken disse que era um homem liberto porque sabia que chorar não era fraqueza. O segredo está em manter o foco nas questões, e focar nas respostas que vão surgir durante a descoberta, sem deixar que o síndrome de impostor, iniba o potencial da eterna jornada de aprendizagem e liderança.
- O sucesso de um líder é maior quando é partilhado
Da estratégia de marketing para o filme fica uma última lição, mas talvez das mais importantes. A Barbie, assim como um líder, ganha quando todos ganham.
. Exemplo disso, são as parcerias de licenciamento que a Mattel estabeleceu com as marcas, já referidas acima e que trouxeram o branding da marca para todo o lado.
. O próprio alinhamento da data de estreia com o seu maior concorrente no cinema: o filme de Oppenheimer, de Christopher Nolan é uma enorme lição, de que é possível ter mais sucesso com uma estratégia para aumentar mercado. Ao invés dos 2 filmes competirem pela atenção e audiências no cinema, ambos capitalizaram em receitas de bilheteira com o movimento “Barbenheimer”, ou seja a sessão dupla dos filmes.
. E a inédita colaboração com a Hasbro, o seu maior concorrente do mercado dos Jogos & Brinquedos no mercado americano, para a criação de produtos de marcas conjuntas como o Monopólio da Barbie, Uno Transformers e carrinhos Hot Wheels do Transformers. A Barbie e o líder une, mais do que separa.
A liderança é uma viagem transformadora, com muitas mais cores do que o rosa. Leva-nos muitas vezes a sair do nosso mundo para encontrar respostas no mundo real das nossas equipas, desafia as normas estabelecidas, os históricos com resultados já demonstrados, e exige um esforço extra para nos adaptarmos a algo maior e melhor. Esta foi a viagem da Barbie, mas é também a nossa viagem todos os dias, enquanto líderes de nós próprios ou das nossas equipas. E para fechar este capítulo cor-de-rosa, e para passar das palavras à ação, deixo a adaptação da frase de Ruth Handler, a criadora da Barbie “Nós, líderes, ficamos parados, para que as nossas equipas possam olhar para trás e ver o quão longe elas chegaram”.