DESDE SEMPRE TIVE O GOSTO DE APRENDER E DE ENSINAR

Antonieta Lima, CEO da Calculóminuto e professora universitária
Esse gozo permitiu-me evoluir nos estudos, tornando-me professora universitária e
coautora de livros. A minha carreira académica começou com o bacharelato em Contabilidade e Administração no ISCA Aveiro, seguido da licenciatura em Auditoria Financeira no ISAG. Posteriormente concluí o mestrado em Finanças e o doutoramento em Gestão, ambos na Universidade Portucalense.

As áreas financeira, contabilística, de gestão e fiscal estiveram, desde cedo, presentes na minha vida, quer por influência da minha mãe, que sempre esteve ligada à área contabilística, quer do meu pai, que sempre trabalhou no mundo dos negócios. Trabalhei, e trabalho, como contabilista certificada em grandes empresas e grupos do nosso país, e fui Diretora Financeira em algumas dessas organizações. À medida que fui crescendo na carreira empresarial, também foi crescendo a vontade de partilhar o meu conhecimento. Para tal criei a Calculóminuto – CM, empresa de consultoria da qual sou CEO, que atua,
por um lado, ao nível da gestão empresarial, controlo de gestão, e otimização de processos, e por outro, ao nível do ensino universitário e da formação.

Enquanto CEO da CM sou muitas vezes confrontada com a resistência à mudança, tendo de consciencializar as pessoas de que a mudança a todos beneficia, e que o insucesso atinge todos de forma indistinta. Esta é uma das grandes dificuldades da consultoria que em muitos casos é vista de forma inspetiva. Por outro lado, e ao nível da otimização de processos relacionados com a gestão operacional, trabalho muito a realidade do chão de fábrica. Neste âmbito tenho constatado nos últimos anos que áreas tipicamente ocupadas por homens (como o chão de fábrica) têm vindo a ser progressivamente ocupadas por mulheres. Por outro lado, e no que se refere à consultadoria são valorizados fatores como o conhecimento, a experiência, a eficácia, a capacidade de comunicação, a capacidade para lidar com as pessoas, o trabalho em equipa, entre outros, não sendo o género um fator diferenciador. Muitas equipas de due diligence já trabalham num contexto de paridade de género, existindo inclusivamente cada vez mais equipas constituída maioritariamente por mulheres.

Enquanto docente, e conhecedora do meio empresarial, colaboro com a Universidade Portucalense e com o Instituto Superior de Entre Douro e Vouga, a par de outras instituições de ensino como o Porto Execute Academy e a Atlântico Business School. Conjugar a academia com o meio empresarial é sem dúvida aliciante e extremamente motivador.
Enquanto docente, os desafios são imensos. Um aluno que nos pede ajuda para arranjar emprego, um aluno que desabafa connosco questões pessoais e familiares, um aluno que interrompe sistematicamente a aula, um aluno que está claramente na área errada, um aluno que por muito que tente não compreende os conteúdos lecionados, um aluno que tenta criar conflitos, … . Estes exemplos têm todos eles um denominador comum: os alunos esperam de nós uma atitude, um comportamento, uma ação, sempre diferenciadora pelo reconhecimento da acrescida sensibilidade que nos caracteriza.

Se na consultadoria a exigência é grande, quando passamos para uma sala de aulas os desafios aumentam ainda mais, pelo que temos de recorrer frequentemente a capacidades que achávamos não ter. Muitas dessas características quase que parecem ter nascido connosco, e vamos aprendendo a aprimorá-las com a experiência e a maturidade, outras simplesmente temos que as aprender e incorporá-las da melhor forma possível na pessoa que somos. Toda esta experiência de consultadoria e docência, em que temos todos os olhos postos em nós, obriga-nos a repensar a maneira como nos posicionamos face aos outros, até porque estar numa situação de liderança, é estar exposto.

Esta experiência empresarial tão enriquecedora, aliada à experiência académica, abriu-me novos horizontes, novas portas, e aquilo que de alguma forma foi germinando lentamente na minha mente aconteceu, sou atualmente coautora de cinco livros. Desses cinco livros, um é na área dos projetos de investimento, um na área da otimização de carteiras de investimento, e três na área do Six Sigma. Uma vez mais com o focus na partilha, mas também na contínua evolução dos meus conhecimentos, surgiram estes livros, em particular os três últimos, relacionados com a otimização de processos e procedimentos, através do Six Sigma, do Lean e, mais recentemente, do LeanSix Sigma.

Se quisermos fazer aqui uma pequena síntese, quando ocupamos determinados cargos como nível C, docente, consultores, educadores, ou seja, lugares em que é necessário orientar e guiar, inevitavelmente surgem questões ligadas com características de liderança. Quando penso neste tema, liderança, mas no feminino, ocorrem-me logo características como capacidade para criar empatia, a forma de comunicar, a atenção aos detalhes, a sensibilidade para lidar com as situações, a inteligência emocional, a confiança, a motivação, a persistência e o trabalho em equipa, entre tantas outras características que poderiam ser aqui enunciadas. Não quero com isto dizer que é necessário ter “super poderes”, nem estou a afirmar que a mulher é um ser superior. Estou apenas a refletir sobre como ser uma líder no feminino, por exemplo, na gestão de topo. Saber orientar e guiar para que no final consigamos obter o sucesso desejado não é de facto uma tarefa fácil, mas é uma realidade com a qual trabalho todos os dias.

Hoje em dia todas as mulheres gozam de uma posição que foi conquistada ao longo do tempo por movimentos feministas que reclamaram a igualdade da mulher na sociedade e no trabalho, e que acabaram por ficar expressas na lei. Apesar de tudo verificamos ainda que em alguns setores de atividade ainda predomina a ideia de que a liderança deve estar a cargo do sexo masculino. Se historicamente formos ver a evolução do papel da mulher na sociedade e na vida empresarial, iremos constatar que no século XIX, e segundo o nosso ordenamento jurídico, a mulher encontrava-se numa situação de subjugação: só o marido exercia o poder, tendo a mulher o dever de obediência. Pequenos grandes passos foram sendo conquistados ao longo do tempo: permissão para
ter poder sobre os filhos, igualdade no casamento e no divórcio, possibilidade de exercer cargos públicos, acesso à escolaridade obrigatória, o direito ao voto, igualdade de tratamento e de oportunidades no trabalho, só para referir alguns momentos determinantes.

Dados do PORDATA, de 2020, mostram que em 1998 a frequência do ensino por mulheres era mais reduzida do que a frequência por homens. No entanto, com o passar dos anos esta situação alterou-se sendo que, em 2018, encontra-se uma situação de maior equilíbrio entre mulheres e homens com formação e escolaridade. Quando olhamos para o número de homens e mulheres com formação a nível superior, a verdade é que atualmente verificamos que a percentagem de mulheres com um curso superior é superior à percentagem de homens em situação semelhante.
Olhando um pouco para aquilo que tem sido a investigação científica neste domínio, e também a preocupação dos Governos sobre esta temática, efetivamente temas como “igualdade de género”, “discriminação de género”, “discriminação no local de trabalho”, “desigualdade no acesso à gestão de topo”, “preconceitos associados à liderança  feminina”, “conciliação entre vida familiar e vida profissional”, “desigualdade salarial”, entre tantos outros que poderiam ser indicados, continuam a estar na ordem do dia. Significa isto que, apesar de a evolução ter sido muito grande, a verdade dos factos é que ainda há alguma resistência à liderança ser exercida por uma mulher, ainda há quem pense que uma mulher é o sexo fraco, ainda há quem coloque muitos entraves à maternidade, quando efetivamente este poder pode ser gozado por ambos os pais. Estamos perante uma sociedade em mudança e, como referiu Charlie Chaplinnothing is permanent in this world, not even our troubles.”