No mês em que se celebra o Dia Nacional da Água e se inicia mais um ano hidrológico, exalta-se a carreira de Alexandra Serra, Presidente do Conselho de Administração da Águas do Tejo Atlântico, que nos fala do seu percurso profissional, aprendizagens e iniciativas.
Olhando para aquele que tem sido o percurso profissional da Alexandra, é possível verificar que, desde que iniciou a sua atividade esteve sempre ligada ao setor da água e do ambiente. Nunca equacionou aventurar-se noutro setor, ou fá-lo, também, pelo sentido de missão pela causa?
Trabalhar no setor da água, para além de ser uma satisfação pessoal, é um grande desafio profissional, nomeadamente agora na Águas do Tejo Atlântico. A indústria do saneamento está em transformação, os paradigmas da gestão das águas residuais urbanas estão a mudar muito rapidamente e é um privilégio estar envolvida neste processo de mudança. Para além da regeneração ambiental através do tratamento das águas residuais de 2,4 milhões de habitantes, a transformação desta matéria-prima nas Fábricas de Água da Tejo Atlântico, em água reciclada, energia, e bio produtos é o caminho de futuro em que já hoje estamos a trabalhar. É também com espírito de missão que estou aqui, porque as atuais funções significam muita responsabilidade e enorme compromisso com as pessoas, com o ambiente, com a saúde pública e também com o desenvolvimento económico do país. Servimos cerca de 1⁄4 da população nacional, de 23 municípios, num serviço disponível 24/24h, essencial e invisível e que conta com o profissionalismo de cerca de 400 pessoas que diariamente operam e man- têm este sistema a funcionar com uma qualidade exemplar e eficaz.
Ao longo do seu trajeto, já coordenou projetos em Marrocos, Argélia, Angola, Moçambique, Cabo Verde, Brasil e Guiné-Bissau. Certamente que a forma de trabalhar, consoante o país em que opera, é diferente entre cada um. De todas estas experiências, qual diria que foi aquela que mais a enriqueceu, de um ponto de vista profissional?
É muito difícil destacar um projeto. Participei em projetos fantásticos ao longo da minha carreira. Todas as experiências me enriqueceram enquanto profissional e como pessoa. Trabalhar em projetos internacionais é muito gratificante, com contextos distintos, culturas diferentes, mas sempre com o mesmo objetivo de levar água potável aos mais vulneráveis, contribuir para serviços de águas mais eficientes e solucionar os problemas de salubridade com sistemas de tratamento de águas residuais. Neste contexto, destacaria as experiências na India, em Moçambique e em São Tomé e Príncipe. O desafio é sempre encontrar a melhor solução dentro do quadro dos escassos recursos disponíveis. “Partilhar conhecimento e aprender” são os principais verbos nestes projetos internacionais. Um dos projetos mais gratificantes em que estive envolvida foi o projeto de ajuda humanitária a Moçambique durante a crise provocada pelo furacão Idaí, em que o Grupo Águas de Portugal se mobilizou fortemente, talvez um dos projetos mais enriquecedores enquanto profissional deste setor. Foi um trabalho de equipa, entre moçambicanos e portugueses, em condições muito críticas, e com o empenho de todos foi possível colocar em funcionamento uma instalação de produção de água potável numa situação onde as populações locais viviam num cenário de catástrofe, com carências básicas e sem acesso à água.
Na altura do confinamento, o abrandamento da produção, das deslocações e do consumo provocado pelas medidas para combater a pandemia do novo coronavírus trouxe boas notícias para a crise ambiental, com uma diminuição da poluição e das emissões de gases com efeito de estufa. Sendo a questão climática tão urgente, seria possível conciliar esta “onda verde” que na altura se verificou com o regresso da vida normal? Se sim, de que forma?
A atividade da Tejo Atlântico está muito alinhada com o que chama “onda verde”. Do ponto de vista estratégico, a empresa está comprometida com a transição da economia linear para a circular e fá-lo nos vários domínios, desde organizacional e comportamental, até às atividades das equipas no terreno e tem em curso vários projetos em fase de implementação e outros em fase de desenvolvimento. Para partilhar alguns exemplos, o reaproveitamento da água+ (a água para reutilização) produzida nas nossas Fábricas de Água, quer nos processos de tratamento- quer nos espaços verdes -, as parcerias com a Câmara Municipal de Lisboa para rega da zona norte do Parque das Nações, o fornecimento de água+ para o sistema de climatização da IKEA de Loures e a rega do Parque Municipal de Mafra são bons exemplos que pretendemos multiplicar e que estamos a trabalhar com os municípios abrangidos por este sistema multimunicipal. Na vertente energética, produzimos atualmente um volume assinalável de energia verde e estão em curso duas empreitadas para instalação de painéis fotovoltaicos. A aposta na inovação é outra das nossas prioridades, numa indústria em transformação, a inovação é um instrumento essencial.
Atualmente, a Alexandra é presidente da Águas do Tejo Atlântico. Para o público menos informado sobre aquilo que é o papel da marca na sociedade, qual é que diria ser a principal missão da Águas do Tejo Atlântico?
Creio que não existem dúvidas sobre a natureza essencial dos serviços de saneamento. Essencial para o presente e para o futuro. Essencial para as pessoas e para as comunidades. Essencial para o bom estado das massas de água. Essencial para criar as condições para o desenvolvimento económico. Por exemplo, não haveria praias com bandeira azul e turistas se não existissem sistemas fiáveis de tratamento de águas residuais, que permitem a despoluição das águas fluviais, estuarinas e balneares.
Mas o valor do Saneamento vai muito para além do impacto que tem no ambiente e na saúde pública, na qualidade de vida das pessoas e na preservação dos ecossistemas aquáticos e terrestres associados. É também uma fonte privilegiada de geração de valor para a sociedade e para a economia. E é neste domínio que é necessária uma mudança radical de paradigma no Saneamento. Não é possível continuar a considerar o paradigma linear do serviço de saneamento do passado onde a água residual é tratada e “rejeitada”. Há que valorizar esta matéria-prima e integrá-la na economia circular, combatendo o sobre uso dos recursos naturais escassos e salvaguardando a água potável para o seu consumo mais relevante: as pessoas!
Esta mudança de paradigma exige uma mudança de atitude e de comportamentos que tem de ser simultaneamente induzida pela indústria do Saneamento, por todos os stakeholders, e sobretudo pela sociedade.
A Águas do Tejo Atlântico é responsável pela recolha, tratamento e a rejeição de efluentes domésticos e urbanos de cerca de 2.4 milhões de habitantes. Quando se é responsável pela condição sanitária de uma região tão grande, em jeito de curiosidade, como é que se assegura que a qualidade da água é máxima, do primeiro ao último habitante?
Com muito profissionalismo e focados em prestar um melhor serviço possível aos 23 municípios e à sua população. A nossa razão de existir é precisamente operar e manter os nossos ativos para que garantam o cumprimento integral das licenças de descarga das águas residuais tratadas nos meios recetores. Temos um controlo rigoroso sobre o desempenho das nossas 100 Fábricas de Água por forma a garantir que cumprimos a licença de descarga para cada instalação, de uma forma eficiente. Para além do bom ambiente e da preservação da saúde pública, sabemos bem que muitas das atividades económicas ligadas ao mar e ao turismo estão relacionadas, também, com o resultado do nosso trabalho.
Cada vez mais se fala sobre uma bioeconomia azul, enquanto modelo económico alternativo, face à crise ambiental que vivemos. Sendo Portugal um país tão rico em termos hídricos, considera que temos feito tudo ao nosso alcance para potencializar as nossas características nesse sentido?
Portugal já percorreu um longo caminho, desde o tempo com água sem qualidade e sem saneamento até ao considerado “milagre português” com qualidade e abrangência quer em termos de abastecimento como saneamento. Para não falar da sua relação com o Mar que sempre foi muito próxima, mas nem sempre equilibrada. Hoje as dezenas de bandeiras azuis hasteadas nas praias são uma das provas que esta relação evoluiu positivamente, com o contributo decisivo dos sistemas de saneamento. Vivemos agora a transformação da indústria do saneamento para o novo paradigma da circularidade, da valorização de recursos e da descarbonização. Estamos a abrir um novo capítulo no percurso da gestão sustentável do recurso Água.
Ainda sobre aquilo que é a consciencialização social para a questão ambiental, considera que todos “vamos a tempo de aprender”, desde o cidadão comum a responsáveis por grandes empresas/indústrias, cujo impacto ambiental é bastante evidente? Ou a “aposta” deve ser nas gerações vindouras?
Esta é uma questão muito sensível para nós. Grande parte das nossas campanhas de comunicação e de sensibilização estão relacionadas com comportamentos, mudanças de mentalidades e boas práticas, para todas as idades.
Para dar apenas dois exemplos, referir que temos na empresa uma área de educação ambiental e um centro localizado na Fábrica de Água de Beirolas, aberto à sociedade e onde anualmente recebemos milhares de alunos para ações de sensibilização e também professores em ações formativas e grupos de seniores interessados em contribuir para a mudança ambiental.
Fazemos muitas ações temáticas de rua em parceria com os municípios e ONG ́s.
A um nível mais institucional e por forma a promover a utilização de água+ (a nossa água para reutilização), temos em curso uma Campanha sobre a qual produzimos uma cerveja com água+, como o nome de Vira, exatamente para Virar mentalidade, Virar conceitos e, principalmente, Virar práticas. Esta cerveja venceu o prémio europeu de inovação de 2021 promovido pela WRE – Water Reuse Europe. Se a tecnologia permite produzir água com qualidade para fazer uma excelente cerveja, porque é que não se generalizam as lavagens de rua com água reciclada?
Paralelamente, em todas as ações que desenvolvemos chamamos a atenção dos comportamentos, como por exemplo, não deitar resíduos na sanita que podem interferir na eficiência dos equipamentos de tratamento, também muito destacados a questão dos plásticos no mar.
Em suma, queremos cidadãos mais ativos na sociedade, com boas práticas e bons exemplos para as atuais e para as novas gerações.
O Dia Nacional da Água comemora-se em outubro, o dia que marca o início do ano hidrológico. Esta é uma data de reflexão sobre os recursos hidrológicos e sobre a sua gestão a nível nacional. Que iniciativas as Águas do Tejo gostariam de destacar?
No passado dia 1 de outubro, e como forma de celebrar o Dia Nacional da Água e o início do ano hidrológico 2022/23, a Tejo Atlântico abriu as portas do seu Centro de Educação Ambiental e promoveu uma visita à Fábrica de Água de Beirolas. Esta atividade representativa foi desenvolvida em parceria com o Município de Lisboa, que assinalou a efeméride com atividades paralelas no Parque Florestal de Monsanto. Nesse dia assinalámos também mais um desenvolvimento do Projeto dos Peixes Nativos, mantendo a itinerância da exposição “Ictiofauna Nativa dos peixes da região Oeste” junto de vários parceiros.
Desenvolvemos também projetos com a APA e com escolas de municípios abrangidos pelo com os projetos “Ecossistemas – Conhecer para Recuperar”, bem como workshop ́s sobre os Peixes de Água Doce Nativos da Região.
Paralelamente e por que teve lugar na mesma semana, gostaria de referir a realização da 6a edição do Caminho da Inovação, organizado pela Tejo Atlântico, na Fábrica de Água de Alcântara e que juntou mais de 450 especialistas nacionais e internacionais num momento onde inovação no setor da água foi o tema central, projetando exemplos e solução técnicas que são uma realidade para garantir um planeta verde e sustentável.