UM PERCURSO NA TRANSFORMAÇÃO DIGITAL DA SAÚDE!

Teresa Magalhães
Teresa Magalhães é Professora Auxiliar Convidada da Escola Nacional de Saúde Pública, Universidade Nova de Lisboa, Comprehensive Health Research Centre, Universidade Nova de Lisboa Presidente da Associação Nova Saúde Pública, Coordenadora do Grupo de trabalho de gestão de informação em saúde da APAH.

 

Com uma formação em Informática de Gestão, em 1995, comecei cedo a liderar equipas, muitas delas em projetos digitais. Primeiro, numa consultora multinacional em 1997 onde aprendi, essencialmente, que a mudança se faz com equipas orientadas e formadas com competências e técnicas adequadas e acima de tudo com líderes que as acompanham e são inspiradores. E cruzei-me com alguns neste percurso!

Em 2005 terminei o Curso de Especialização em Administração Hospitalar e entrei no mundo da saúde e dos hospitais em particular. Aqui, tive a oportunidade de pôr a escola que trazia ao serviço dos hospitais onde tive o privilégio de trabalhar com alguém que muito estimo – o Dr. Alfredo Lacerda Cabral. Ele permitiu-me criar uma equipa que me ajudou a criar uma visão estratégica de sistemas de informação para o hospital e colocá-la em prática. É no ano de 2009 que inicio o meu primeiro mandato enquanto Vogal do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Setúbal. Em 2009, estávamos a digitalizar o hospital e questionávamos estava a informação e o conhecimento para suportar a gestão. Passados dois anos, decidimos instalar um dos primeiros Business Intelligence em Portugal, projeto de referência com um prémio Hospital do Futuro. Já em 2015, somos o hospital piloto a instalar a Prescrição Eletrónica Médica – Receita eletrónica (PEM).

No ano de 2008, inicio a minha aventura académica na Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa, ingressando como Auxiliar Convidada. Esta simbiose entre a vertente académica e a prática nos hospitais permitiu-me ter uma abrangência de conhecimentos continuados que não me deixaram estagnar.

Decido então começar o doutoramento em Saúde Pública na Universidade Nova de Lisboa, formando-me em 2016 na especialização de políticas, gestão e administração em saúde com um tema ligado ao digital: modelos preditivos na área do Enfarte Agudo do Miocárdio. Nesse mesmo ano, assumo funções como administradora hospitalar do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte, dirigindo primeiro o Departamento de Pediatria e depois o Departamento de Coração e Vasos, onde tive oportunidade de me cruzar com dois grandes líderes, a Profa Maria do Céu Machado e o Prof. Fausto Pinto; acu- mulando o cargo de Assessora do Presidente do Conselho de Administração para a inovação e tecnologias de informação. Numa entrevista ao Hospital Público, em 2017, referia que uma das grandes funções de um administrador é gerir equipas e conseguir que as mesmas trabalhem. “O administrador tem um trabalho de mediador, que passa por encontrar e propor soluções, tendo em vista não só a eficiência, mas o balanço entre a qualidade e a inovação.”

É neste enquadramento que dinamizo a implementação de um programa de telemonitorização da insuficiência cardíaca crónica desafiando a Prof.ª Dulce Brito que consegue mobilizar uma equipa empenhada em criar este caso de sucesso no Serviço Nacional de Saúde, recentemente publicado.

No final do ano de 2017, sou convidada pelo Presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH), Alexandre Lourenço, a criar um grupo de trabalho para a área de sistemas de informação. Como consequência da criação do grupo, nasce o grupo de trabalho de gestão de informação em saúde onde – com um grupo de profissionais de saúde que tive o privilégio de aceitarem o meu convite – realizamos a missão de contribuir para a elaboração de recomendações e propostas de melhoria sobre temáticas associadas à gestão de informação em saúde; promovendo o desenvolvimento de programas formativos de atualização contínua. Mas já retornaremos a este grupo de trabalho. Em 2018, fui convidada a assumir um novo desafio de Presidente da Comissão Executiva do Hospital da Cruz Vermelha e mais uma vez as equipas foram desafiadas à mudança, culminando numa reestruturação digital e organizacional dentro da instituição. No ano de 2020, a Academia falou mais alto e a convite da atual Diretora da Escola Nacional de Saúde Pública, Profa Carla Nunes, uma líder com uma visão inovadora do ensino nesta área, desafiou-me a liderar a área de inovação da Escola, entre o ensino e outros projetos.

Esta opção pela Academia veio permitir que desenvolvesse projetos há tanto tempo adia- dos, sem tempo para os poder concretizar. Em particular os relacionados com a transformação digital na saúde e as mudanças que têm de ser efetuadas para a mesma poder acontecer.

“A transformação digital é essencialmente uma transformação cultural, de mentalidades e de uma forma de estar na sociedade, percebendo o que podemos fazer para melhorar os nossos ambientes de trabalho e com quem nos relacionamos, tornando o sistema de saúde mais eficaz, mais eficiente, mais rápido, com mais qualidade e abrangência.”

“O digital é frequentemente confundido com a mera implementação de sistemas tecnológicos, em vez de estar relacionado com tornar a experiência de utilização dessas tecnologias mais humana e relevante para cada utilizador final.”

E exige uma estratégia e liderança efetivas. “Dois dos motores para a transformação digital na área da saúde são, por um lado, o aumento da esperança média de vida, com a consequente necessidade de acesso a cuidados de saúde e, por outro lado, a crescente necessidade de ade- quação na formação de profissionais de saúde, além da necessidade de melhoria da eficiência das próprias instituições”.

“Como poderemos então ultrapassar este fenómeno para continuar a garantir cuidados de saúde a toda a população? Como preparar os profissionais de saúde para uma era de escassez de profissionais, mas com um auxiliar poderoso que é a tecnologia? Será a era do digital um desafio também ele na área da formação dos futuros e atuais profissionais de saúde? Segundo o relatório do Topol Review (2019), dentro de vinte anos, 90% de todos os empregos no SNS inglês exigirão algum elemento de competências digitais” . Esta problemática levou-me a desenvolver um curso inovador com uma parceria internacional envolvendo entidades diversas. O Digital Health Executive Course que tem como líderes do consórcio a ENSP-Nova e Nova IMS . Este curso pretende colmatar necessidades de formação de competências de profissionais de saúde nesta área, mas também na formação de líderes digitais.

Voltando ao grupo de gestão de informação em saúde da APAH, vários foram os materiais que este grupo criou dos quais destaco os cursos de proximidade com o cidadão através da telessaúde da Academia APAH Go Digital e mais recentemente (dezembro de 2021) o livro de Transformação Digital em Saúde: contributos para a mudança. Esta obra nasce da reflexão que fizemos sobre o que poderíamos contribuir para desenvolver conhecimento neste domínio e vem ao encontro dos dois objetivos da mis- são deste grupo; pretendendo por um lado ser um guia que incentive a procura de soluções na área da saúde e por outro constituir um espaço de partilha e de aprendizagem.

O futuro da transformação digital da saúde, depende também, de todos nós e do que cada um individualmente pode fazer para a mudança. Vamos continuar o nosso caminho, trazendo para a discussão pública temas pertinentes que façam a diferença.