Fundada em 2015, a Smart Studios foi a primeira empresa em Portugal a trabalhar o conceito de co-living. Atualmente, têm 625 apartamentos em operação, é líder de mercado no setor e prepara-se para dar inicio à construção de 590 camas ainda este ano e mais 900 em 2023. Vera Kendall, a sua administradora, trabalha no setor imobiliário há mais de 15 anos, manifesta um conhecimento profundo do mesmo e das caraterísticas necessárias para vingar.
Se a máxima “tudo na vida é uma questão de tempo” – ou timing, como é mais recorrente nos dias de hoje – tem alguma dose de verdade, podemos dizer que o percurso de Vera Kendall, desde os tempos de estudante até à criação da Smart Studios, uma área de negócio que não existia em Portugal, está marcado por episódios que o comprovam. Licenciou-se em Economia, na Universidade Católica Portuguesa, área de estudos que considera “importantíssima para entender qualquer sector, um meio para chegar a um fim”, mas o seu leque de interesses é variado, tendo, paralelamente, concluído os últimos graus de ballet da Royal Academy of Dancing. “A nossa visão deve ser global”, defende. “Devo dizer que também gostaria de ter tirado História – mas as escolhas devem ser feitas em função do tempo. E assim foi.”
Se num primeiro momento, Vera agradece aos pais o facto de a terem convencido de que a matemática “importa sempre”, numa fase posterior mostra-se agradecida à Universidade Católica pela boa gestão que faz no envio dos currículos dos alunos e no apoio aprestado na procura de emprego já que foi através destes métodos que conseguiu um estágio de Verão na Embaixada dos Estados Unidos em Lisboa e o seu primeiro emprego, na antiga Amorim Imobiliária. Corria o ano de 2006 quando se deu a entrada de Vera Kendall no ramo imobiliário, mais precisamente na área de retail. Vivia-se, então, “um boom de aberturas de Centros Comerciais, num mercado “altamente concorrencial e com projetos de qualidade”. Neste contexto, Vera fez parte de “desafios relevantes, adquirindo experiência de negociação”. No entanto, os retornos mais valiosos que retirou da experiência foram os ensinamentos que o seu diretor de então lhe transmitiu: “ensinou-me a simplificar os temas complexos e a conseguir atingir os objetivos mais complexos dentro dos deadlines”. De forma simplificada, “foi uma boa escola”.
Pouco depois, a grave crise económica que abalou o mundo a partir de 2008 – com grande impacto no sector imobiliário – obrigou a uma reestruturação na empresa, sendo Vera a “a única pessoa da equipa a não ser despedida”. Apesar da conjuntura pouco favorável, foi aqui que a própria percebeu que estava na “altura de dar o ‘salto’ profissionalmente”. Após algum tempo a averiguar qual seria o melhor caminho, concluiu que “o que eu queria mesmo era trabalhar num mercado menos volátil e mais resiliente, abordando a crise como uma oportunidade”. A oportunidade chegou do norte da Europa, com uma vaga para o cargo de diretora de expansão da Engel & Volkers, uma imobiliária de luxo alemã que procurava dois responsáveis para representar a sede em Portugal.
Entre os 200 candidatos, Vera Kendall não ficou com uma das vagas, mas sim com duas. Na entrevista defendeu que seria capaz de assumir o cargo sozinha, mas não tão sozinha como esperava. “Quatro dias depois da entrevista descobri que estava grávida e uma semana depois ligaram-me da empresa para me contratar.” A novidade “não foi um problema” para a empresa que no espaço de dois anos passou de três para 12 franchisados – “o que neste segmento de mercado foi fantástico”. Ao relembrar esta altura da sua vida, Vera destaca a “possibilidade de organizar o trabalho e conciliar com a pessoal, acumulando responsabilidades á medida que a marca crescia”. “Foi uma boa experiência tanto a nível de aprendizagem como de crescimento profissional.”
Permaneceu na Engel & Volkers até Setembro de 2017, mas 2 anos antes começou a colaborar no family office do seu marido – que sempre teve interesse pelo imobiliário e, concretamente, pelo conceito de micro-apartamentos ou alternative housing –, o que a levaria à próxima grande aventura. “Começámos a viajar pelo mundo a visitar residências de estudantes e co-living e a participar em todas as conferências de um setor em franco crescimento”. Rapidamente perceberam que existia “um grande potencial de negócio”, pelo que decidiram criar uma marca, fruto da conjugação do know-how adquirido e da sua adaptação à realidade portuguesa. Nascia, assim, a Smart Studios, uma empresa pioneira em Portugal no mercado do co-living.
Conscientes da responsabilidade inerente ao facto de serem os primeiros, definindo o paradigma para os que se estabelecem de seguida, Vera Kendall refere que foi criado um “modelo de qualidade”. “Fizemos questão de seguir os requisitos e exigências técnicas praticados no setor numa fase de maturidade, como é o caso da Holanda, Alemanha ou Reino Unido. Foi um verdadeiro trabalho de equipa, e foi um sucesso”, explica. Durante o processo de criação e afirmação da Smart Studios a aprendizagem foi uma constante, na qual Vera e o marido se fizeram acompanhar de uma “equipa forte e ambiciosa porque ninguém consegue fazer tudo sozinho”. “A equipa tem estar aculturada, coordenada e atenta a todos os pormenores. Temos de estar no terreno, e perceber o nosso cliente”, esclarece.
Quando questionada sobre os conselhos que daria aos millenials, atendendo à sua experiência de anos no mesmo sector de negócio, Vera Kendall sublinha que a “atitude e a ética são fundamentais, hoje e sempre”, duas características que confessa procurar também nos seus colaboradores. A empresária consegue mesmo encontrar diferenças nos perfis dos miillenials – que “tendem a variar entre causas e motivação nem sempre se identificando com o ritmo das organizações” – e os profissionais na casa dos 30 anos – muitos dos quais saídos de “universidades de prestígio e determinados em chegar rapidamente ao topo, o que pode resultar em demasiada pressão”. “Existe um percurso, com uma certa humildade, experiência e maturidade até se chegar a um cargo de responsabilidade. Pessoalmente, fez-me muito bem estar sete anos num trabalho intenso, com dezenas de reuniões por semana, com negociações contratuais e financeiras.”
Para além da oferta de serviços de co-living, a Smart Studios distingue-se das demais empresas do setor pela preocupação que demonstra em relação à comunidade, seja no que concerne à vida em comunidade – no âmbito da ecologia e da sustentabilidade – ou ao desenvolvimento pessoal e profissional, ao mesmo tempo que tenta prestar uma boa experiência aos seus residentes, muitos dos quais acabados de sair da casa dos pais. “É uma fase crucial das suas vidas que ira determinar a sua formação como pessoas”. Entre os serviços oferecidos destacam-se as aulas de yoga, pilates, sessões de mental health, workshops de cozinha e, ainda, hortas comunitárias.
Apesar de todo o sucesso alcançado com a abordagem inovadora, a Smart Studios também se ressentiu do “forte impacto inicial” da pandemia da COVID-19. Mesmo assim, o ano de 2020 fechou com “627 apartamentos” inaugurados, um número que para Vera Kendall é o reflexo do seu próprio percurso. “Aprendi a reagir e a adaptar-me rapidamente a novas circunstâncias, o que tem sido uma das grandes vantagens da Smart Studios. Temos uma gestão altamente dinâmica, e quando surgiu o novo coronavírus, soubemos rapidamente adaptarmo-nos.”
Se, por um lado, o fecho das universidades foi um grande revés para o negócio, a procura que se seguiu por parte de profissionais que pretendiam um espaço para residir e ali recorrer ao teletrabalho acabou por compensar e restabelecer o equilíbrio. Mesmo antes da Direção Geral de Saúde emitir as suas diretrizes, foram implementadas “todas medidas de segurança e higiene, “o que deu total segurança” aos residentes. Simultaneamente, a estratégia de marketing e da área comercial foram adaptadas e redirecionadas, de forma a abrangerem “um novo target” que podia variar de universitários em aulas online, para equipas e CEO’s de empresas em teletrabalho. Perante este trajeto de sucesso, seria de esperar que a postura de Vera Kendall em relação ao futuro passasse pelo conformismo. “É gratificante ver as nossas ideias e nosso trabalho árduo serem implementadas e a darem resultado. Também gosto muito da gestão dinâmica que este negócio me permite – os excelentes resultados estão á vista.” Apesar de se sentir realizada e não pensar muito no futuro, admite que este pode trazer “novos projetos”, até porque, defende, “o céu é o limite”!